quarta-feira, 18 de dezembro de 2019

Pessoas #1: do risco e suas muitas formas

Hoje aconteceu algo interessante. Besta, mas interessante: estava a caminho de Tokyo, indo pra estação, ainda perto do trabalho. Meio apressado, não paro de olhar no relógio do celular de tempos em tempos. Numa dessas, tento atravessar a rua, mas a mala pesada impede meu avanço. 

Merda.

Coloco a mão no bolso em busca das horas. Do bolso sai o celular e uma moeda de 1 yen, que cai rodopia pelo ar, até cair na via. 

Olho. 

Penso em abaixar num impulso para pegar.

Penso novamente.

"- E se passar um carro?"

"- ...e se passar um carro e bater na minha cabeça?"

Sei que parece catastrófico, e até idiota. Mas não seria mais idiota ainda morrer por 1 centavo? 

Fico pensando no risco e na impulsividade das nossas ações. Sempre nos julgamos tão racionais e donos de qualquer reação, inclusive as impulsivas, aquelas que parece termos total controle sobre, mas das quais sabemos menos do que gostaríamos. Me pergunto como isso mudaria se fosse $10...ou $20... ou $100 caídos na via...ou numa via de metrô/ trem.... quão rápido isso me impulsionaria a arriscar minha vida sem considera que sim, poderia muito bem passar um carro na frente do qual, por impulso, eu coloquei minha cabeça na frente.

Bom... passou.... e eu vim pra Tokyo, com um centavo a menos no bolso (mas vivo).

Por estes dias fiquei me pergunto o quão justo é a sociedade recompensar as pessoas pelo risco que elas tomam. Claro, até pouco tempo atrás eu buscava uma vida alheia aos riscos do mundo, com uma casinha na beira do campus, uma família não rica, mas que poderia arcar com uma ou duas viagens por ano, indo pro trabalho de bicicleta, sem muito luxo, pesquisa, interesses intelectuais, risco zero, que-o-mundo-se-exploda-lá-fora-eu-tenho-distinção-do-que-é-certo-e errado-eu-e-meus-teoremas-volto-pra-casa-ao-final-do-dia-sem-risco.

Well.. a vida parece ter outros planos pra mim. E eu pra ela  hee hee

Por estes dias ganhei uma bela grana na bolsa.. coisa de em um dia tirar uns mil dólares. Fiquei impressionado. Com remorso. E repensando se era justo.

É justo? Eu não fiz porra nenhuma, só empreguei meu dinheiro ali. Mas.... seria isso o mesmo que abaixar pra pegar uma moeda?

Não... não é o caso. Primeiro que nem todos têm esse direito. Na verdade nem é um direito. Ter a oportunidade de ter um ganho desses é mais um privilégio do que qualquer outra coisa. Um moooonte de gente não tem acesso a essa informação, a esses meios de informação, ou à possibilidade de empregar recursos. Foi simplesmente um ato burguês: eu ganhei dinheiro sem pingar uma gota de suor. E não sei bem por que, mas o prazer não ... sei lá, bateu, mas não foi o bastante pra me ofuscar a vista.

É sabido em pesquisas que a partir de certa quantia de valores, de salário, a recompensa monetária já não se associa mais a prazer (há pesquisas sobre). Então por que ficarmos buscando mais, mais, e mais..?

Eu sei que o post ficou um pouco confuso, mas essas duas coisas me parecem tão duas faces de uma mesma moeda que não há como dissociá-las: o risco nos move, nos recompensa, e nos pune, por que não deixa de ser uma face da nossa ganância. 


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