sábado, 25 de abril de 2020

Apego

Essa estória tem umas semanas já, de uma amigona que mora em Portugal com o namorado, estudante de doutorado. Depois de  passado um dia inteiro escrevendo sua tese, trabalhando, redigindo, reescrevendo, desfazendo, unindo, control+c pra lá, apagando, control+v pra lá, ela vai pra cama. Acorda no dia seguinte, liga o notebook e.....

.... nada: todos os arquivos no seu hd estavam apagados.

TODOS!!!

Ela entrou em pânico: e a tese, como assim?! 

Minha amiga entrou em  desespero. Começou a pensar nas fotos que tinha, no último vídeo que fizera com a recém falecida avó, nos anos e anos de arquivos e outras coisas que estavam ali. Caiu no choro, inconsolável.

Essa estória até que terminou bem, com um backup que ela havia feito num hd do namorado umas semanas antes. Mas o mais interessante de tudo (além da lição de hoje: FAÇA BACKUPS!!!) foi essa sensação que ela dividiu comigo: a de que somos apegados demais àquilo que temos e fazemos. 

Fiquei pensando sobre o trabalho que agora escrevo. E sobre minhas coisas.... sobre minhas anotações de aulas, cartas que recebi, fotos de infância... e me vêm à mente a vaga lembrança de leituras que citam os traumas de pessoas que perdem tudo em catástrofes ou incêndios. Será que realmente somos aquilo que já produzimos? Ou aquilo que carregamos com a gente? Mesmo que seja nessa "virtualidade" dos bits, zeros e uns que - mesmo com/apesar do tempo - insistem em se alinhar para nós, mantendo  o significado que algum esculpimos neles.

É muito estranho se sentir tão apegado a coisas... por que percebemos a difusa fronteira que nos separa daquilo que é material, daquilo que é vaidade, daquilo que parecemos não precisar, mas que parece ser tão parte do que somos que sua perda é como uma amputação, uma parte de nós que deixa de existir.

Não pude deixar de olhar pros meus livros e coisas de outra forma depois disso. Claro, corri pra fazer um backup das minhas coisas (e recomendo que você faça o mesmo!), mas... fiquei pensando se fiz isso por apego, ou pura e simplesmente por responsabilidade e prudência. Sim: oque fizemos é parte de nós na medida que demonstra como dispendemos nosso tempo. Mas por outro lado... somos muito mais que isso(!). Somos Michelangelos moldando  bits por este mundo, e tão importantes quanto os Davids e Pietás binários que criamos. No entanto... são essas esculturas que os outros, de fora, podem ver: nós, como criadores, somos só matéria que perece, vida que perece e decai. 

Bom... pegue o seu lencinho por que o post tá tomando um rumo choroso hahaha Brincadeira :P Só foi mesmo um momento reflexivo que tive ao ouvir isso tudo. Torço pra que tenham ficado lições.

2 comentários:

Thais disse...

Pois é, do acontecido ficou alguma coisa... Uma impressão, um ponto de partida... E percebo que ficou não apenas para mim :) Que bom.
Levei o fato ocorrido para a análise e a "versão" da analista foi outra hahahahahaha seria a análise uma sessão fria de Raio X? Uma "chapa" bicolor do nosso esqueleto esquadrinhado? Mas isso já é conversa enveredada para outro rumo.
Tão bom, Rafa, te reencontrar por aqui.

Rafael disse...

Bom te ver de volta, Tha! :)

É...essa chapa de raio-X talvez diga muito sobre oque ficou por dentro.... "você tá com um apego entalado na garganta... pelo visto a coisa é séria".... uma máquina assim ainda está pra ser inventada (vai ver se chama analista mesmo rsrs)