sexta-feira, 5 de agosto de 2022

Terra Brasilis: quando o apito da fábrica toca pela manhã

Esse recomeço nos trópicos tem me ensinado muito.. ou ao menos acho que tenho aprendido muito. A primeira semana, a apreensão de ver tanta coisa nova ao menos tempo, o coração batendo rápido diante de máquinas tão grandes, tantas engrenagens, a vida tranbordando em graxa e números.... Como havia dito numa entrevista: "-sabe quando o Chaplin entra nas engrenagens da máquina? Eu quero sair da zona de comforto justamente fazer aquilo..." (sem ficar louco, claro hee hee :)



Modern Times - Factory scene, Charles Chaplin

Às vezes eu tenho que me lembrar do que eu estava buscando nesse processo. Isso porque a dor vem: é difícil, me sinto incompreendido ou incapaz de entender aqueles que me cercam... me sinto perdido num mar tão mais vasto do que antevia... remo sem entender por um tempo até me recobrar e reequilibrar, percebendo que não vou atravessar esse mar na força. As pessoas que me cercam tem me feito rir tanto, me ajudado de uma maneira tão enorme e sem o véu de desconforto que pro qual o excesso de especialização havia me jogado até eu pisar no Japão. Me pergunto se ter ido foi o passo que precisava para poder dizer tchau pra tanta coisa. "Como se ter ido fosse necessário para voltar"...lembro-me de Gil falando aquilo que, por tanto tempo, nem mesmo considerava e que hoje vejo que talvez sim...

Estranho pra mim ainda é essa mistura de tanta coisa - de carreira, de país, de proximidade com família e amigos, de foco, de rumo, de tempero, de cultura... a colega de trabalho que morou no Japão na decada de 80 conversa comigo em japonês.... fico surpreso em conseguir falar tanto... acho que às vezes subestimo o quanto absorvo do mundo que me cerca... a cidade me surpreende, me atiça, me mantém acordado até altas horas da noite jogado no mel que só algumas coisas nos oferecem. Sigo, me deleito, tento depreender as rachaduras da cidade nas quais não quero cair, observo outras nas quais quero me adentrar, me encanto com a riqueza de olhares e formas, a humildade sem subserviência daqueles que vejo pela cidade, se esforçando pra ganhar a vida num ambiente hostil a muitos, favorável a poucos... 

Me adapto, me ambiento, mas ainda tento entender aonde caibo. Pertenço sem pertencer, acordo sem abrir os olhos, corro sem querer correr, pedalo sem querer sair do lugar. Pareço viver em tantas contradições que, quando o vento bate, voam pelos ares me mostrando que todas fazem sentido. Saio eu atrás delas, tentando pegá-las de volta, agregando-as nos braços, abraçando oque posso em desespero... tudo pra ver que, no fundo, não preciso de nada. Páro e ouço os que estão à minha volta e penso em como diversas barreiras que antes existiam parecem ter sumido.... não sei oque é... só sei que está sendo bem melhor do que imaginava.

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