Feriadão aqui (ao menos teoricamente). Ontem o M-san, um padeiro daqui com o qual sempre troco idéias no melhor estilo "small-talk/broken-nihongo", me convidou pra uma festa: "vamos lá!!! Você vai animar, esquecer das coisas tristes da vida". Nadei, jantei, meditei, hesitei e me perdi em delongas.... fiz tudo pra não ir... mas era tão perto que acabei indo...
E, apesar do medo de corona, de ficar doente logo aos 48 do segundo tempo, foi bom: ver gente, rir um pouco - ou ao menos tentar. Entro na festa... vejo o DJ com um álbum do Herbie Hancock... chego nele e pergunto em japonês se tem o headhunters... "-...ahhh...hoje não trouxe.." fico puto, dou uma tapa na cara dele e pulo a mesa pra assumir as pickups.... oque, claro, se resume na minha resposta também em japonês: "ahh tudo bem... " e sigo adiante, aproveitando a paisagem que vislumbro pela janelinha do barco. Mas não aguento muito - mais pela bebida e cheiro do cigarro do que por qualquer outra coisa... acabei por ficar a maior parte da noite fora do lugar, conversando com o padeiro. Sem falar que minha tolerância a álcool foi pro espaço: não consigo mais... pelo visto vou virar um abstêmio... só espero não virar um temente a deus chato.
O padeiro abriu o coração pra mim, e veio me dizer que é um grande adorador da "erva"... e que acha o Brasil muito mais paraíso do que os japoneses cotidianos que encontro: "- lá vocês podem fumar mais à vontade, dão valor pras coisas boas da vida"... bem que eu via pelo jeito dele, meio hippie. Só não sabia o quanto: "- saí numa trilha de bike, era pra durar só 2 semanas...mas quando fui ver, tinham-se passado 3 meses..."... e a gente ria das estórias, ele me falando do porque jogou âncora (há 2 anos) aqui, várias coisas parecidas com a minha vida - itinerância, transiência, viver trabalhando como monge regrado em minimalismo e efemeridade... Interessante que a gente nunca havia se conversado tanto assim: no máximo era eu fazendo piada sobre algo, ou falando num japonês de criança de 5 anos, aprendendo palavras, tirando dúvidas ... acho muito louca essa capacidade (também minimalista) de conseguir rir com os outros nesse subespaço de baixa dimensão vocabular, onde tudo se reduz a uma comunicação quase-lacônica: poucas palavras e muito ruído.
O frio pegou. Voltei pra casa que, por sorte, não é longe. A saudade, que estava ali no cantinho e parecia ter arrefecido, bateu de novo... me veio uns acordes de uma música do Dylan na cabeça...
Mama, you've been on my mind, Bob Dylan
Minhas idéias, como num rio que flui montanha abaixo, desviadas nas palavras.... "whispering to myself.... pretending that I don't know..." ohhh Dylan boy... mudando o curso dos meus pensamentos... I am not askin’ you to say words like “yes” or “no”.... Interessante que me levou um tempo pra entender essa letra, pois nunca prestava atenção nela. Até entender que esse "Mama" era um chamado de ajuda, uma mão que se estender para um outro, e não ele dizendo algo à sua mãe. Um "caramba... estou pensando em você de novo" ... daqueles que nasce das entranhas... Fui pinçando as palavras até ver que era uma canção de coração partido... até que fiquei sabendo mais tarde que ele escreveu depois de um divórcio no qual ele ficou bem mal..... shitty stuff, folks!
"Even though my eyes are hazy..." Cheguei em casa... "Ì am not pleading, or saying I can't forget you"... Pareço me sentar numa encruzilhada de onde não sei como partir "Perhaps it's the color of the sun cut flat And covering the crossroads I'm standing at"... Resolvi estender a mão também (mais uma vez): envio uma mensagem pra uma ex-roommate no Rio que - como uma irmã mais velha e doidinha - me deu dois esporros: por não procurá-la diante dessa bagunça, e por falar que eu não estou respirando. "Rafinha.... respira, macho" (me diz, com um sotaque cearense adorável... "I do not pace the floor, bowed down and bent, but yet... Mama, you been" .... O acaso de ter encontrado essas pessoas.... sortenorme.... saudadenorme...
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