"Since I had nowhere permanent to stay, I had no interest whatever in keeping treasures, and since I was empty-handed, I had no fear of being robbed on the way" [Matsuo Bashô , The records of a travel-worn Satchel]
segunda-feira, 5 de dezembro de 2022
Adultescência, tardia mas precoce
O pleito, as pestes e a copa do mundo
segunda-feira, 21 de novembro de 2022
A peste e o pleito
Fiquei doente há umas semanas. Aconteceu do covid finalmente chegar a mim. O café com um gosto horrível aquecia minhas manhãs com um amorgor sem igual. Me pergunto se é este o gosto que pessoas que não gostam de café sentem ao tomá-lo... se assim fosse pra mim, eu me compadeço: também eu nunca beberia dessa bebida.
Foi foda e foi triste. Ouvia do apartamento as pessoas comemorando a vitória do Lula (ou seria, comemorarem a derrota de Bolsonaro?), ouvia fogos, "tchau, miliciano!", eu me segurando pra não sair na rua e ir comemorar numa das avenidas da cidade. Foi um dia e tanto, cheio de preocupações e no qual fiquei em casa, ouvindo de longe a esperança de que esse pesadelo acabou sem nem mesmo poder participar. "-Paciência... celebre por dentro". E assim, o fiz.
Isso foi há algumas semanas. Desde então, a covid se foi, o atual governo continua governando (bom... continua no poder e sem fazer nada - como sempre, mas bem menos ruidoso que antes). Eu tento aguardar o primeiro de Janeiro sem ter uma crise de ansiedade: vem logo, vem logo!
Estranhamente, estes 4 anos me fazem pensar que não dá pra esperarmos um governo fazer muito pelas mazelas que afligem este país. Fico me perguntando se posso contribuir com algo, se posso fazer algo pra ajudar. Será que voltei pra isso? Em conversas tenhos ouvido bastante a metáfora de que não sou uma folha em branco, que por mais que tente assimilar a diferente cultura que me cerca, tenho muito a trazer de volta. Eu, pareço ficar incerto entre esses dois universos (o de dentro e o de fora) e fico em conflito: será que existe um meio termo?
Nem sei como cheguei a este tema. Nem falei também que minha mãe pegou covid; provavelmente de mim. Por sorte, não teve nada de grave e levou a doença melhor que eu. Fico imaginando oque teria sido em outro caso, pensando nas tantas estórias nesse país de pessoas que carregam o peso nas costas de terem infectado alguém que amam. Dei sorte, e mais sorte ainda é saber que hoje eu posso aproveitar um pouco mais a companhia de diversas pessoas que até então estavam longe de mim. OK, por uma manhã e tarde me perguntei se tudo isso não seria um grande erro, representado por mais 4 anos desse governo estapafúrdio e desumano... será que aguentaria? Nessas horas me pergunto se o Brasil faz sentido e chego à resposta de que não, não faz. Assim como nenhum outro lugar faz. Mas aqui tem uma grande densidade de gente que eu gosto, então...
...enfim: a covid passou, tanto a minha quanto a da minha mãe. Estamos bem. Agora é só esperar por Janeiro, que vai ficar ainda melhor.
terça-feira, 8 de novembro de 2022
Primeiros passos
sábado, 5 de novembro de 2022
Próximos passos
terça-feira, 1 de novembro de 2022
Semana pós-apocalíptica
domingo, 30 de outubro de 2022
O final de semana mais sombrio
Depois de uma semana difícil, cheio de violências e um primeiro turno no qual eu ainda acreditava que os brasileiros nunca mais seriam coniventes com a barbárie que estes últimos 4 anos viram, lá vamos nós: hoje é dia de eleição.
Estranho demais estar aqui e ver essas pessoas nas ruas com a camiseta da seleção de futebol brasileira (hoje em dia, o símbolo das pessoas que votam na extrema direita). Oque será que essas pessoas vêem que eu não vejo? Oque elas estão dispostas a comprometer para que possam votar em um cara tão indigno e incompetente quanto o Bolsonaro? Fosse esta uma eleição entre todos os outros candidatos, eu acho que estaríamos ok. Mas justo ele?
A extrema direita me estarrece e surpreende pela sua destreza em conseguer extrair oque as pessoas têm de mais primitivo: as respostas impulsivas, a desumanização daqueles que divergem em opinião, a falta de projetos claros, o excesso de pautas morais, a maneira esguia pela qual conseguem fugir de qualquer responsabilidade gerencial que têm. É uma tristeza estar aqui no Brasil e assistir esse teatro enquanto sentado no picadeiro.... por que sim, é uma grande palhaçada.
Hoje é domingo e acabo de descobrir que peguei covid. Mas estou bem, ou oque é que isso signifique. Fui votar pedalando: está um dia lindo lá fora. Quero sair, mas quero me refugiar desse mundo de balbúrdia e incompreensão em que vivemos. Quero descansar.. quero poder virar as costas e dizer que esse problema não é mais meu como, de alguma maneira, fiz por uns bons anos.
Agora não.
Agora estou perto. Vejo as entranhas do país mais de perto e como este sofre e se debate em tremores, frágil. Me pergunto oque posso fazer. Será que algo? Só esperar?
Tenho dito a amigos que apesar de ter ojeriza à extrema direita, ela nos ensina muitas coisas. Por exemplo: o nível de engajamento e participação deles é muito grande. Claro que isso não vem de graça: há o apoio incondicional, os questionamentos jogados pra debaixo do tapete, a corrupção da qual ninguém fala (ou, em muitos casos, pode falar). Bom...talvez retire oque escrevi acima... por que não dá pra dissociar uma coisa (boa) da grande maioria daquilo que a extrema direita representa (algo ruim).
Fico me perguntando oque o amanhã há de nos trazer.. será, mais 4 anos? Me pergunto se ver isso lá de fora seria mais fácil.... ou se me deixaria igualmente angustiado. Páro e me lembro do dia em que soube que Trump ganhou enquanto nos eua: "Trump triumphs", dizia o new york times... fiquei com uma ressaca gigantesca.
O Brasil, em 2018, não chego a mim. Claro, fiquei triste, mas... de certa forma já imaginava que o elegeriam: o Brasil, país da novela, adora algo desconhecido, uma trama (olha a facada!), alguém que se clame fora do sistema para salvar a pátria. É um povo que não se baseia em métrica alguma pra tomar decisões (well... sendo honesto, que povo é?) Mas agora, depois de 4 anos de desarranjos e desgovernos, quem, em sã consciência, ainda votaria num cara assim? Sei lá se é a covid que me derruba e deixa prostrado, mas acho que não, é a política mesmo: difícil engolir.
Nessas horas eu me pergunto, mais do que se vai ser aqui mesmo que eu vou ficar, se há algum lugar no mundo onde se esconder. Não há! Tá tudo muito parecido. E OK, ressalvas sejam feitas: a qualidade de vida em vários lugares onde morei é muuuuuito melhor que em São Paulo. Em sendo assim, que diferença faz passar por isso longe, ou perto?
Não sei...voltar foi difícil, mas me parece fazer muito sentido. Por que não é algo que se vê por uma única perspevctiva, mas sim diversas delas ao mesmo tempo. Somente quando estamos satisfeitos com nós mesmos só sei que está sendo uma delícia estar aqui, ter contato com o melhor que o Brasil pode me dar, me perder diante de tantas possibilidades, não entender as piadas que se referem a coisas que perdi enquanto não estava aqui, ter dificuldade para entender memes, poder abraçar as pessoas, pegar covid, votar pra tentar tirar esses extremistas fdp do poder etc. O Brasil e suas mazelas, às vezes um gosto amargo, noutros momentos um gosto agridoce... isso que nem falei que aqui é a terra do bolo de rolo...
... ai Brasil.... olho pra você, olho pros EUA e sua bagunça, olho pro Japão e sua apatia, a Europa com sua xenofobia... e fico confuso... vai ver o melhor é ficar parado e tentar mudar oque puder por aqui mesmo.
segunda-feira, 17 de outubro de 2022
Relações e bolhas familiares
Uma das coisas mais interessantes de se relacionar é descobrir como outras pessoas vivem, como elas gastam seus tempos, como elas passam seus dias. Que delícia, ver como alguém mora: toda pessoa é um universo!
Quando essa mundo superficial de primeiras impressões fica pra trás e chegamos à profundidade do relacionamento - daqueles onde se frequentam casas, conhecem tios, tias e afins - aí adentramos num mundo novo e, de certa forma, numa nova família, regidas por regras e interações muitas vezes inimaginadas. Acima de tudo, é comum a relação vir com agregados, precisamente, mães, pais, irmãos, cachorros etc. Não existe amor no vácuo, a Física dos relacionamentos poderia nos dizer com suas leis. E, de fato, a prática (experimental) mostra isso.
É curioso observar que cada família tem suas regras...como num microcosmos antes nunca estudado, olhamos pra um mundo que se abre em contraste com o que trazemos na nossa bagagem: nossas famílias e seus elos também são um universo estrangeiro para os que vêm de fora.
E dessas explorações, oque podemos tirar? Talvez muito, talvez nada. Claro, uma mordida de cobra, uma jaca que cai de uma árvore ao nosso lado e nos assusta, uma gruta escura onde nunca se vai, os cantos silenciosos. Todo um mundo de novidades nos cerca, nos enche de sons e texturas, regras e sabores até então desconhecidos. Nos percebemos cercados, preenchidos por tantas coisas intangíveis que tentamos tocar, entender pelos nossos olhos e pelos olhos dos nosso parceiros. Até descobrirmos que, no fim das contas, esse universo nunca será realmente o da relação, pois esta ficará sempre numa bolha, a bolha na qual toda relação deve ficar.
Talvez isso seja importante: pra preservar e blindar um novo mundo que nasce de outros mundos já sólidos e de raízes profundas que são as famílias, cheias de vínculos, vícios e virtudes que a que regamos também há de ter.
Mas será que essa bolha estoura?
segunda-feira, 10 de outubro de 2022
Rotina #1
terça-feira, 27 de setembro de 2022
Terra Brasilis : toda forma de amor
Tem um tempo já: minha mãe começou a falar de um amigo da época em que trabalhava numa empresa como secretária, época em que eu nem existia ainda. "-É, conheço F desde que ele tinha 19 anos." Eu não achei nada de mais: "-Legal, mãe. Feliz que você mantém contato com amigos de tão longa data."
Passou um tempo e minha mãe foi na casa dela enquanto ele a visitava. "- Foi estranho... a mãe parecia uma adolescente. Será que ela e ele estão ficando ou algo assim?" Não descartei a hipótese, mas achei pouco provável.
No final de semana foi aniversário do meu sobrinho. Na hora de darmos tchau para s donos da casa (os avós paternos, ele decendente de japonese) minha mãe, num tom de piada-confissão, disse à outra avó: "- Quem diria... eu também arrumei um japonês", e emendou a contar a estória na frente de todo mundo, à queima roupa, como se nada tivesse acontecido.
Vai ver pra mim soou como algo fora do comum - uma senhora de mais de 70 anos começar a namorar, mas... vai ver é a coisa mais normal do mundo mesmo e eu que me adeque "aos novos tempos".
Em todo caso, fiquei feliz e surpreso... o Brasil tem me surpreendido com umas coisas que nunca imaginaria.
quinta-feira, 22 de setembro de 2022
Contato humano
Uma das coisas que eu mais buscava nessa volta ao Brasil era contato humano. Apesar disso, parece-me que ando tendo menos contato humano aqui do que no Japão.
Por que será?
A grande questão talvez seja o home office, claro. Mas disso nasceu uma percepção: a de que, por mais que eu goste do contato com família e amigos, me sinto ainda mais "socialmente nutrido" quando tenho contato com estranhos.
Sim, ter contato com amigos é bom, é gostoso. Mas é o contato com estranho que nos traz algo mais, uma interação que nos mostra que somos cercados de um mundo de regras sociais invisíveis que devemos seguir, respeitar e nos equilibrar. Amigos, famílias, também têm isso, claro! Mas são linhas menos tensas; quando são estranho, essas linhas são tão tensas que, se não nos cuidarmos, podemos rompê-las.
Enfim.. foi só um pensamento breve.
sábado, 10 de setembro de 2022
Terra Brasilis : cápsula do tempo
Lá se foram mais de três meses desde que aportei nesses trópicos.
A vida parece seguir rápida como água que corre montanha abaixo depois de chuva forte, corredeira voraz que quer levar tudo no seu caminho. Eu, tento me agarrar ao que posso para não ser levado junto.
Nas duas últimas semanas chegaram pelo correio as caixas que havia enviado lá do Japão meses atrás. Muito estranho recebê-las, abrí-las e sentir aquela sensação estranha... porque será que eu me enviei essas coisas? Eu realmente dava valor pra essas coisas ou eu simplesmente achava que elas seriam úteis para mim no futuro? Me perco em perguntas retóricas, sem esperança de uma resposta.
Foi um estranhamento completo.. um misto de curiosidade com toques de desdém: me pergunto se o Rafaello do passado olhava pro futuro e pensava que tais objetos, livros e afins seriam úteis ao Rafaello do futuro. Gosh, como eu estava errado em várias coisas.
Me abro a me perguntar se, de fato, foi um erro meu ou simplesmente uma admissão de que minha vida acabou tomando rumos que não pude antever. Rumos para os quais não tinha ferramentas disponíveis em mãos quando saí de lá; há coisas cuja utilidade só vamos ter consciência adiante, quando soubermos da existência dos seus propósitos. E havia um monte de propósitos que eu ignorava (e ainda ignoro). Como antecipá-los? Impossível.
De alguma forma abrir essas caixas foi tocar numa cápsula do tempo, uma evidência paupável do meu apego a coisas, uma evidência visível de que minha vida parecia não ser muito (minimalismo?), um snapshot de uma vida que um dia foi e agora mudou, um esboço de alicerces de coisas que já não me sustentam mais... um desconforto em formato físico.
Ainda assim, a curiosidade (que bem citei acima) fez do evento de rever essas caixas uma experiência ambivalente: senti também fagulhas de felicidade em rever um rascunho, um livro, um desenho, uma peça de arte que um dia fez parte da minha antiga casa. Uma parte de mim que um dia foi maior e hoje é só mais um capítulo que escrevi e mal me dei conta de que acabou. De certa forma, reencontrar esses objetos sela o fim dessa estória, símbolos do último elo que me mantinha unido ao Japão.. um fio de Ariadne preso neles (ou seria em mim?) garantindo que um dia nos encontraríamos de novo, e que nesse labirinto de dias fortuitos e escolhas que se avolumam em direção ao futuro, houvesse um garantia de que nunca nos perderíamos uns dos outros.
quinta-feira, 18 de agosto de 2022
Terra Brasilis : despachante
sexta-feira, 5 de agosto de 2022
Terra Brasilis : palavras farpadas
De vez em quando a vida me "presenteia" com palavras farpadas.
Julgamentos e comparações; algumas pertinentes... diversas delas indevidas, outras inadequadas, umas um tanto injustas.. um monte delas dolorosas.
Palavras farpadas que se enrolam no meu corpo e descem rasgando meus ouvidos.
Me dói sentir que mesmo mundos tão próximos ao meu contém doses substanciais de frivolidade e descuido, falta de zêlo que nada de maneira honesta e imatura num mar ainda raso.
Ouço em silêncio e dor, me acolho diante de coisas que nenhuma outra palavra consegue anular... mas abro espaço pra deixar as pessoas alinharem oque dizem com oque fazem: a única forma de mitigarem certas dores que estes nos infligem é dar tempo a elas...e nos dar tempo para poder observar em suas ações aquilo que palavras nunca vão conseguir mascarar quando em desarranjo...
Me aflijo em imaginar que alguns tomam serenidade e paciência por fraqueza... mas me acalmo em pensar que, se for pra ser incompreendigo, então... só a ação do tempo há de fazer efeito, dizendo quais caminhos devo ou não seguir.
Olho em volta, sinto que também me iludi em achar que real sou só eu. A ilusão de achar que só eu tenho inconsistências e descompassos. Não, meus leitores queridos: todos as têm. Everybody hurts... everybody is made up of fragments.... kintsugi, firme e forte juntando peças desde mil novecentos e tanto... a música toca ao meu redor... queria que fosse um jazz, mas é um sertanejo... não... não... melhor mudar de rádio e procurar outra coisa pra ouvir... ou você prefere que eu toque algo pra você ouvir?
Terra Brasilis: quando o apito da fábrica toca pela manhã
Terra Brasilis: zeros e uns
Da redação: a cidade de São Paulo amanheceu com um problema enorme na primeira sexta-feira do mês de Agosto. Suas linhas de fibra ótica estavam todas entupidas de zeros (0s) e uns (1s), que se agregavam em desvario - 1s penetrados em 0s de maneira promíscua, 0s se esfregando em 1s, e 1s tão agarrados que uma única coisa pareciam ser. "-Foi mel demais nas redes... grudou tudo", disse um técnico da companhia telefônica local.
domingo, 24 de julho de 2022
Terra Brasilis: "falar menos, ouvir mais"
domingo, 10 de julho de 2022
Terra Brasilis : para brincar na gangorra... dois
Sabe quando você não quer que o dia acabe? Que a companhia de uma pessoa é tão, tão gostosa que não se sabe como dar tchau, que é um embaraço admitir que um encontro tem que ter fim?
Acho que tive isso poucas vezes na vida. Mas com a mesma pessoa... acho que foi a primeira vez.
O primeiro date, dois desconhecidos, o beijo aos 48 do segundo tempo, atordoados pela pressa de que no dia seguinte eu iria embora pro Japão. Dessa vez... um roteiro tão parecido... eu me contendo, esperando um sinal claro de quando ir, de quando agir, o mesmo desejo-química, dessa vez com um pouco de susto da minha parte (por não esperar por ele)... o mesmo beijo, ainda que diferente... o mesmo toque, ainda que mais quente.. o mesmo sorriso, ainda que debaixo de lágrimas... o mesmo carinho, ainda que debaixo de toneladas de reticência... o mesmo cuidado, ainda que tolhido pelo medo de se doar ou de doer...
["doar" e "doer"... duas palavras tão próximas e tão diferentes ao mesmo tempo]
A paciência, regendo tudo como uma maestrina que nos diz em que direção deveremos ir, onde deveremos ficar, onde olhar, pelo que esperar... é difícil ter paciência diante do que parece indiferença, ou do que parece impaciência, ou motivos irreais para se enredar em discussões onde estas simplesmente não existem... me lembra muito os finais de relacionamento pelo qual passei, onde as palavras descuidadas parecem querer acelerar a decomposição daquilo que ainda não entrou em metástase... sou carinhoso, mas ainda assim me recolho em dor quando percebo que meus pés não tocam mais o chão, e que estou no alto, esperando o outro lado me trazer de volta ao chão e não me deixar falando sozinho... "para brincar na gangorra, dois"... lembro da Marisa Monte cantando... ainda assim, sigo tentando.. há coisas na vida que valem á pena, e eu sei que o medo nos cega, nos molda e nos aflige...
... só sei que vai levar um tempo... "can't stop laughing" ao longo do caminho ... vai ver é isso que estou precisando agora...
[Curioso como o contato físico muda o cenário das coisas... e de uma semana pra outra tudo muda...]
[...esse kintsugi mágico-cicatrizador, que só pitadas de tocar e sorrir conseguem catalisar]
sábado, 25 de junho de 2022
Terra Brasilis : tudo num ponto (e a maior distância entre dois deles)
"Por meio dos cálculos iniciados por Edwin P. Hubble a velocidade de afastamento das galáxias, pode-se estabelecer o momento em que toda a matéria do universo estava concentrada num único ponto, antes de começar a expandir-se no espaço. A “grande explosão” (big-bang) de que se originou o universo teria ocorrido há cerca de quinze ou vinte bilhões de anos."
quarta-feira, 22 de junho de 2022
Terra Brasilis : assimetrias
Eu tenho uma certa facilidade pra detectar assimetrias, sejam elas estéticas, em relações, em estruturas etc. É algo que é um tanto natural, um pouco de como vejo o mundo e o entendo. Desse modo, assimetrias também são uma das primeiras coisas que noto quando estou insatisfeito com algo. Assim que alguma espécie de simetria começa a ser violada, eu logo percebo - parece que o meu corpo reage a tais aberrações quase que imediatamente.
Pra falar a verdade, acho que nem é meu corpo que reage, e sim meus valores: exigir A e fazer B, tratar coisas iguais de maneira diferente... meus olhos não se prendem tanto assim no porque disso acontecer, mas ficam em desconforto extremo assim que noto algum desvio "estatístico" que foge a algum entendimento. Em geral, são coisas que fogem do entendimento até mesmo daqueles que perpetram tais atos (seja por cegueirignorância, viés cognitivo, ou por falta de coragem em admitir oque se vê).
Acima eu só citei assimetrias que se aplicam a coisas-objetos distintos (digamos, falei de uma certa “simetria comparativa”). Outra, muito fácil de lembrar, é a espacial. No entanto, existem também assimetrias temporais: antes, A era tratado de maneira X, agora ele é tratado de maneira Y. É curioso então fazer um paralelo de que tudo que se mantém constante no tempo em geral é tido como uma lei. Mais curiosamente ainda, há um resultado matemático - que explico aqui de maneira muito grosseira - que é quase uma contrapartida ao comentário anterior: ele diz que pra tudo aquilo em que há uma simetria, há alguma quantidade que se mantém constante. No caso, se estirarmos essa analogia um tanto, oque se mantém constante é o nosso entendimento da questão: se ontem-hoje A era tratado como X, amanhã será tratado como X, e assim em diante; em resumo, a simetria (temporal) perdura.
Infelizmente, nós humanos não somos regidos por leis. Bom...talvez seja bom que não sejamos mesmo, ao menos não em todos os aspectos das nossas vidas. É claro que gostariamos de viver num mundo onde todos cumprissem regras, não houvesse roubos e coisas piores... mas em que nível a vida seria suportável se fossemos, em todos os aspectos, rígidos, incapazes de corromper os elos que nos cercam para poder levar uma vida mais leve ou, digamos, normal?
É interessante estar aqui no Brasil e ter sido testemunha de tantas maneiras de se interpretar o mundo, suas leis, suas "simetrias" e "assimetrias". Isso sem falar no processo de observar a maneira como eu e muitos dos que me cercam deformam essa geometria de leis nas quais estamos submersos, alterando-a conforme o necessário... ou mesmo nos fazendo de desentendidos quando somos vítimas ou praticantes de tais assimetrias.... das quais ninguém escapa, sem sombra de dúvidas...
sábado, 18 de junho de 2022
Terra Brasilis : tangled up in a huge mess & bureaucratic matters
"
...
Sometimes we are too selfish and arrogant to realize that there is way more than ourselves, our pain, losses, failures or our confusion around. We forget that we are part of a whole and that we are just dust amidst all the beauty and peace that nature can give us.
"Praise and blame, gain and loss, pleasure and sorrow, come and go like the wind. To be happy, rest like a giant tree in the midst of them all." (Buddha)
Tchau, pessoal. Vou lá.... ganhar o dia e agarrar o sol com a mão.
quinta-feira, 16 de junho de 2022
Terra Brasilis : mentira
"Hoje eu tenho apenas uma pedra no meu peito
Exijo respeito, não sou mais um sonhador
Chego a mudar de calçada
Quando aparece uma flor
E dou risada do grande amor
Mentira"
Samba do grande amor, Chico Buarque
Hoje me lembrei dessa música do Chico que, coincidentemente(!?), foi parte da trilha sonora de uma viagem a dois pra Paraty, em meio a risadas e mais risadas. Lembrei dela ao perceber que, no fim das contas, essa sereia-estória é cheia de ludibriações de diversas formas, quase um fogo cruzado. Sim, o ato de enganarmos o outro é evidente em diversos momentos e é o que mais causa dor. No entanto, há um outro tipo de enganos que acontece também, quando ludibriamos a nós mesmos... esse é o mais complexo, porque envolve viéses cognitivos, ansiedades, expectativas. Assim, por ser tão sorrateiro, mal reparamos quando esse tipo de engano acontece.
Hoje me atentei pro fato de que tenho tentado me mostrar pro outro sem vulnerabilidades, passar a impressão de que essa sereia-estória é passado e tudo o mais, quando na verdade não: não passou... ao menos pra mim. - "Boa sorte! Siga teu caminho!" - mentira! Quero seguir adiante, quero me abrir pra novas estórias, começar de novo nesses trópicos, mas... parece que aguardo ainda, algo que não sei bem oque é: um raio, uma palavra, um aceno... não sei... quero dar um passo à frente, mas tudo oque vejo adiante parece me remeter a sonhos e idéias que tinha antes de tudo isso começar....
Não sei... hoje me senti injusto ao só ficar reiterando que a decisão ("culpa"?) disso tudo não é minha etc etc... quando na verdade só deveria acolher as palavras que disse no post anterior e não só dizer, mas finalmente aceitar que não, que isso é engano meu: me desculpar, não há palavras pra sustentar kintsugi tão rápidovernight... No fundo, talvez a única coisa que posso dizer é que estou aqui, que estou aguardando, me mostrar vulnerável e não me esconder atrás de palavras rasas que não representam oque sinto. Claro que quero seguir adiante! Claro que quero abraçar o futuro! Mas... ainda quero fazer isso com uma sereia muito específica nadando em volta do meu barquinho...
... e quando eu digo o contrário, é evidente: mentira, Raffaello...mentira. (Pelo menos agora eu sei disso.)
[Então... só me resta manter a calma e a serenidade...]
[...não ter medo de me mostrar vulnerável...]
[... ter paciência, ser grato e não ser injusto :) ]
quarta-feira, 15 de junho de 2022
Terra Brasilis : piracema #1
Ontem conversava com um amigo de infância e ele me apontou algo interessante: que de todas as minhas mudanças pelo mundo, as únicas que foram "loucas" foram a minha ida pro Rio de Janeiro (há uns 15 anos) e esta de agora.
Na hora fiquei pensando no que ele falava e vi que ele tinha razão. De certa maneira, sempre equalizei todas minhas mudanças como se fossem simplesmente mudanças de cidade e ponto - tudo igual. Mas não: fui pro Rio sem saber se ia rolar ficar lá. Passei dois meses naquela incerteza, inicialmente sozinho no apartamento minúsculo de um amigo que então viajava. Depois de um mês meu amigo voltou de viagem e ficamos lá, eu + ele + a namorada dele que vinha quase sempre: fui forçado então a dormir debaixo da mesa, onde fiquei por um bom tempo.
Terminados esses dois meses de sol, matemática e incertezas, voltei pra São Paulo e, envolto em dúvidas, comecei uma pós no mesmo lugar onde fui undergrad e que havia me aceitado até aquele momento: uma angústia enorme naquele ambiente hostil, salas sem janelas, os mesmos alunos de antes, aquele pessoal apático e desunido de sempre... aí chegou a oferta para se ir pro Rio: aceitei e fui, pra morar por mais um tempo debaixo da mesa do meu amigo, até encontrar um apartamento.
Ontem meu amigo me relembrou desses detalhes... que a ida pro Rio era meio 0 ou 1: se não fosse aquilo, não seria mais nada, talvez nem pós fizesse, dado meu desgosto em ficar no mesmo lugar em São Paulo. Foi um pulo sem rede de proteção, algo que se assemelha muito ao que fiz agora. Mais uma vez, felizmente (e por sorte), está rolando.
Fiquei meio desconcertado em não ter percebido isso antes... aí reparei que, curiosamente, os dois momentos mais difíceis dessa trajetória foram justamente sair daqui, e voltar pro mesmo lugar... mais um koinobori/piracema, eu voltando pro lugar de onde saí e tendo que morrer um pouco pra isso: quando fui, em cortar raízes profundas de uma vida de tantos anos e tantos amigos em São Paulo. Agora, quando volto, a dificuldade em reatar laços com um país que sinto desconhecer e com o qual tenho vínculos, mas não mais assim tão fortes. Pareço morrer pois uma parte de mim se sente rejeitada enquanto aqui. No entanto, a cada passo que dou me sinto mais vivo, tentando assimilar uma cidade nova, um tentando acomodar o outro, mutuamente. Meu corpo parece faiscar ao tocar as ruas, meus olhos se deslumbram com tudo, em como a vida consegue florescer e crescer num ambiente cercado de tantas incertezas e injustiças. Ao mesmo tempo que tudo isso me dói os olhos e a alma, me empolga ver tanta vibração e energia em pessoas que têm que se esforçar tanto por um lugar ao sol... admiro e quero reencontrar isso, algo que parece ter ficado em estado latente diante das facilidades do "primeiro mundo" (termo que não curto, diga-se de passagem), mas que vive dentro de mim desde sempre.
Agora, uma digressão pra dizer que tenho tido dificuldade em processar cognitivamente tantas pessoas na rua: todas são muito diferentes!!! Meu cérebro quer assimilar todos os detalhes - o cabelo enorme de uma mulher, o nariz estranho do senhor que senta no metrô, a roupa curiosa do travesti que me pede dinheiro na rua, o cabelo cool da pessoa que dá em cima de mim no metrô (hoje, um homem, mas bem andrógeno)... meu cérebro precisa reaprender a ignorar tanta informação... há de levar um tempo.
Nesse processo de assemelhar o pulo de saída do útero, e o de volta a ele, hoje eu vi como as coisas mudaram: lembro dos milhares de perrengues em ter ido ao Rio, e agora o conforto em voltar, com o poder de decidir onde quero morar, como quero morar, oque quero fazer... ter saído daqui foi realmente uma loucura dolorosa... ter voltado é outra, mas bem menos ruim. Ambas, cheias de possibilidades. E, como meu amigo falou - e não tenho como discordar - são ambos momentos para se crescer muito e brotar de novo, transcendendo medos que muitas pessoas simplesmente não vêem ou, na marioria dos casos, nem sabem que todas as vidas igualmente possuem...
Muito feliz em ter ido... muito feliz em ter voltado... esse koinobori-piracema é mais um ciclo que parece se fechar na minha vida.... um que, em gratidão e serenidade, pareço receber nos meus braços sem nunca sequer ter vislumbrado que seria assim...
...a graça de viver algumas coisas sem planejá-las... :)
Terra Brasilis : o jardim dos caminhos que se encontram
É bizarro isso de tentar reparar algo envolto em dor... um kintsugimpossível onde todas as memórias boas parecem ter sido engolfadas por uma onda gigante que só deixou pra destruição pra trás de si.
E como "curamos" isso?
Honestamente, não sei. Mas andei pensando... num cenário onde não cabem desculpas, talvez não sejam palavras a reparar as dificuldades. No caso, quando nenhuma desculpas cabe é nítido que ou o lado que ouve está sendo muito rígido em querer um pedido específico - como num script (que o outro, claro, desconhece!), ou o lado que ouve simplesmente não sabe oque quer ouvir. Em situações assim, não há pedido de desculpas que seja o suficiente.
Talvez não sejam palavras a se resolver uma questão complexa assim, mas simplesmente permitirmos que memórias afetivas novas sejam criadas. Isso volta a um post anterior do qual falei sobre como processamos eventos como bons ou ruins a depender de quando um momento ruim se dá dentro dele (no começo, ou no final): um relacionamento que termina em um momento difícil tende a sofrer com esse viés de seletividade, de buscarmos sempre as memórias mais recentes.
Anyway… foi só uma digressão mesmo…
domingo, 12 de junho de 2022
Terra Brasilis : o jardim dos caminhos que se bifurcam
As maiores lições do dia (e da semana):
1) aceitar que algumas coisas são tão dúbias e incertas que acomodam mais de uma perspectiva.
2) aprender a ouvir e manter a calma, mesmo diante de coisas que discordamos.
3) aprender que medo é medo; que é normal tê-lo, e que nem sempre o manifestamos abertamente (isso vale pra todos os lados de uma relação).
4) aceite o medo, mas não se submeta a ele, nem tome decisões precipitadas sob efeito do mesmo.
5) aceitar decisões dos outros e respeitá-las, mesmo quando estas te machuquem.
6) mesmo quando discordarmos de alguém, manter o respeito e não erguer a voz; nossa razão não está acima da razão de ninguém, ainda mais em terreno incertos, cheios de ambiguidades. O melhor sinal de que estamos nos excedendo é alguém ter que implora desculpas para nos acalmar: nessas horas somos nós que devemos parar e nos desculpar com o outro lado.
7) aceitarmos que as maiores dores e provações talvez tenham um porquê, e que muitas vezes são um sinal da imperfeição intrínseca a tudo oque nós humanos tocamos e construímos. Talvez seja isso oque nos torna grandes, e oque indica aquilo que nos é importante na vida.
8) aceitar que algumas pessoas nos veem de maneira rígida: esta é a maneira como nos entendem e não adianta mostrarmos nada, apontarmos fato algum, ou fazermos coisa alguma. É assim que nos vêem e ponto.
9) aceitar que, às vezes, a dor nos faz interpretar as coisas de maneira errada (e da maneira mais dolorosa possível); a dor é o pior dos vieses. Acima de tudo, que nos permitamos a surpresa diante dos nossos próprios enganos.
[De certa forma, essa foi a coisa mais bonita e significativa do dia.]
[Fiquei mais feliz ainda em poder ter me permitido isso.]
[Removeu uma tonelada de desapontamento das costas.]
10) não silenciar outras pessoas, nem anular oque estas dizem ou sentem. Nunca peque em assumir que "o meu caminho é oque faz sentido" quando se trata da vida de uma outra pessoa.
11) ser grato, mesmo diante daquilo que nos machuca e cujos propósitos fogem ao nosso entendimento.
12) desapegar e saber deixar partir (em especial quando oque se diz/faz já não faz mais diferença aos olhos dos outros).
[ps: salvo engano, "o jardim dos caminhos que se bifurcam" é um texto do Jorge Luís Borges.]
quarta-feira, 8 de junho de 2022
Terra Brasilis : extravio
Tentei dormir. O corpo cansado de 30 mil horas de aeroportos, esteiras rolantes e aviões. Tento estar grato por ter um teto e um lugar no qual ficar agora que chego: tudo oque preciso, não exatamente oque queria.
Me esperavam no aeroporto. Como um mantra que se repete dentro de mim, tudo oque preciso, não exatamente oque queria. Tento ser grato e aceitar... Até consigo ser grato.... mas aceitar ainda está em processo (apesar dos últimos posts, não cantei vitória ainda, infelizmente).
Deixo as malas no canto... parece pequena perto de tanta vida que tive enquanto grande diante do apartamento que me recebe. Penso na minha próxima casa... como há de ser, onde há de ser... esses dias pela cidade vão demandar alguns tours de reconhecimento
Jetlag.
Acordei às 5 AM, o corpo parece ainda não ter saído do Japão.
A mente tão pouco.
O coração, perdido pelo mundo, extraviado entre oriente e ocidente.
Em que balcão reclamo?
Dissonâncias cognitivas.. ainda outras: dessa vez o mundo me cerca de cidade e carros, enquanto ainda tento processar tudo oque se passa. Como pode, ontem atravessava Shibuya debaixo de chuva, alimentava um pônei num parque... e hoje estou em São Paulo, minha mãe dormindo no quarto ao lado...eu de olhos vidradabertos esperando pelo dia que já amanhece com tons de cinza?
Ainda não vi ninguém. Talvez encontrar amigos ajude a processar que já estou aqui, e que aqui estarei por um bom tempo. Paro e penso "-sério mesmo que você morou 5 anos na Ásia?! E não sei aonde e aonde ... mais 7 anos?!" Minha vida às vezes é um eterno disbelief... olho pra trás e não acredito que fiz algumas coisas. Mal acredito também que hoje estou aqui, encarando algo que nunca mais imaginaria acontecer: voltar pro Brazil (olha só... outro "erro" typo que brotou em verborrágia...) Amanheço ansioso, um pouco cinza como o céu acima de mim, com leves toques de cor garoando ali-ali-e-acolá.
A fome bate, me chamando pra minhas próprias limitações e pro fato de estar vivo. Suspiro....
Brasil, espero que não me demore muito pra te entender de novo.... e que não te demore muito pra me aceitar de volta.
segunda-feira, 6 de junho de 2022
0 dias entre o oriente e o ocidente: “purposefulless”
Já não tenho mais propósito no Japão. Nem o Japão tem muito propósito pra mim: não sei ser turista aqui; gosto, mas se não tenho oque fazer… não rola.
Mil horas me separam do meu vôo e não sei oque fazer com elas: cruzo a shibuya crossing milhares de vezes, ando pelos parques da cidade outro tanto de vezes etc? Não… o dia de hoje começa e permanece em chuva, nublado, como se externalizasse bem essa virada de página que agora acontece: hoje piso em terra nipônica, amanhã, em solo brasileiro… que mundo grande-pequeno…parabólicamara, ê ê!
Os amigos me enviam as últimas mensagens - uns de tchau, outros de ansiedade “já chegou?!?”, outros de saudades “já se foi?!? Não vá!!” - ninguém sabe bem onde estou, nem eu. Estou em trânsito, entre o oriente e o ocidente, flutuando entre esses dois mundos.
Amanhã acordo numa outra realidade: planeta tapioca, família, reconectar-me com esta última, seguir adiante em outros projetos…. sempre difícil recomeçar “do zero”, mas já fiz isso tantas vezes… por mais que minha ansiedade me deixe alerta quanto a isso, sei que vou dar conta (há uns estudos legais sobre o tema, explicando como lidamos com mudanças e sofremos mais em antecipá-las do que ao vivê-las… o cérebro emula mudancas, de alguma forma nos punindo mas nos preparando pra elas).
O aeroporto vazio, nada aberto quase: um deserto de fome que assola viajantes desavisados. Please, alimentem-me. Mais tchaus, dessa vez pelo telefone: de onde surgiu tanta gente?! Sair é difícil, chegar num outro país também. Ótima ideia não ter seguido com planos de migrar novamente pra um país novo: certamente seria um baque recomeçar num ambiente ainda mais cheio de novidades que o Brasil (embora já me prepare pro choque cultural reverso, de tentar ser adulto no Brasil/ América do Sul pela primeira vez).
That’s it, folks. Esta sereia (gosh… vou até deixar o erro… corretor ortográfico querendo que passe raiva e me pregando peças…aliás, já leram “mishearings” do Oliver Sacks?)… De novo: ESTA SÉRIE termina aqui. さよなら!Au revoir! Goodbye! Adiós! Tchau! Nos vemos logo mais, no outro lado do mundo.
domingo, 5 de junho de 2022
1 dias entre o oriente e o ocidente: primavera japonesa com um toque francês
Ontem encontrei H de novo. Jantamos, rimos um monte. Pedi desculpas por ter sido um idiota que não conseguiu dar a ela oque ela precisava (patterns!!??) Aí o namorado dela começou a ligar e ligar… queria que nos encontrássemos com ele e outros amigos dela. “-Rafa, você quer vir também? Só fico com receio… ele é meio difícil às vezes.” Aí meu alerta acendeu: adoro encontrar pessoas difíceis e observá-las… assim, lá fui eu hee hee :)
Dessa vez ele foi mais doce: conversamos mais. Ele pareceu se abrir, queria saber mais de mim. Ela super emburrada com ele “-ele é meio grosso… francês demais às vezes… não são um povo simpático que nem vocês”…. “-Te entendo… brasileiro é meio besta… a gente ri à toa, sem ter motivo algum pra rir”…
Caminhei por Shibuya e Shinjuku à noite. Que loucura, cidade que não pára! Viro pra H no meio do trajeto e pergunto: “-por que será que várias das minhas ex ou antigos relacionamentos acabam nas mãos de franceses?" Ela não sabia responder… Pelo menos dessa vez consegui conhecê-lo melhor: vi que ele é um cara legal e que gosta dela. Conversamos um monte, ele super interessado em saber sobre oque faço e como vejo as coisas; eu, igualmente interessado em ouvir as estórias dele (o cara veio pro Japão da França… de carro!). Sem falar que ambos foram maduros e respeitosos comigo: isso diz muito à respeito de uma pessoa. Fico feliz e tranquilo em sabê-la com um cara comedido, alguém que teria como amigo.
[ね?!… Acho que isso já diz tudo :)]
Doeu-doei meu ukulele pra um casal de amigos de okinawa-yamagata. Foi presente da minha ex, mas não tinha como levá-lo ao Brasil. Ao menos o deixei em boas mãos, gente que há de usá-lo e tocá-lo bastante; não poderia ter melhores donos. Saber abrir mão e ser grato a tudo de bom que me trouxe… mas saber jogar no mar, diminuir o peso do barco e seguir adiante… talvez ela entenderia (acho que não...fazer oque).
Hokusai me desapontou…até pensei em comprar uma xilo da grande onda de Kanagawa, mas… melhor desapegar: meu tempo no Japão acabou, não tenho como levar mais nada daqui.
Ontem me chega uma mensagem “surpresa” que me deixou feliz. Olho a minha mensagem anterior…. que embaraçoso… por que fui enviar isso?! Fiquei sem graça… deveria ter tido um pouco mais de compaixão… qualquer pessoa insegura faria isso… ao mesmo tempo, tenho compaixão por mim tbm… qualquer pessoa assustada faria o mesmo… Respondi feliz e surpreso: adoro surpresas e gente que toma a iniciativa (sem ser impulsivo, claro!).
Sigo pras últimas visitas. Daqui a pouco mais tchaus… os amigos japoneses me perguntam sobre o Brasil, sem a condescendência com que europeus ou americanos perguntam… curioso, como a ideia do América first ou Europa berço da civilização traz danos a qualquer interação… porque será que brasileiros e japoneses conseguem ser tão próximos?!?!
Dou um grande abraço no amigo brasileiro e em sua familia. Escalador e parceiro de muitas vias, ele me dá um carabiner de aço: "-Um pra cada amigo mais chegado!". Peso da porra… não sei se rio ou choro: peso… mais peso… seria melhor ter me dado uma bigorna... ainda assim, adoro.
Volto pra Tokyo. Tarde no parque. Vamos ver no que vai dar… depois tenho que arrumar as malas. Correria, amanhã é um grande dia. Pareço querer absorver a cidade inteira pelos poros do meu corpo, abraçar tudo… esse país vai me deixar saudades, de alguma maneira…. e de todas as maneiras possíveis…tudo meio scrambled dentro de mim, como na Shibuya crossing: uma ordem desordenada… saudade desde já que te pega por todos os lados e não se sabe de onde vem...
[Me lembrei agora que em inglês se diz “shibuya scramble square” pro cruzamento mais famoso do país…. nao poderia ter melhor nome.]
O dia termina, jantar num restaurante… caminho até uma jidohanbaiki (umas dessas máquinas automáticas de venda de bebidas)…bem devagar, como num ritual, tiro meu tênis já furado e pedindo pra não viajar e os deixo aos pés da máquina: “- que algum morador de rua te encontre e te faça feliz por essas ruas”. Caminho pro Airbnb descalço… como há anos atrás, em Paraty… penso na semelhança-diferença… na areia da praia que hoje vira asfalto japonês…mas hoje, eu sozinho… e daqui em diante… caminho calmo… torço para regressar assim, em serenidade… mas talvez um pouquinho desajuizado 😬
sexta-feira, 3 de junho de 2022
2 dias entre o oriente e o ocidente: universalidades, ambiguidades, uprooting ++
Está no fim… ou seria no começo? Não sei… vivo uma situação (outra?) tão ambígua e que me permite diversas perspectivas. Posso ficar a sofrer, chorando pitangas aos montes… ou olhar para o futuro deslumbrado com as possibilidades que este parece me trazer… que caminho escolher?
Fico meio puto de pensar que quase tudo que me aconteceu nesses últimos 3 anos se concretizou ou consolidou apenas nas últimas 3 semanas de Japão. Pqp, como assim, procurar emprego e receber uma oferta… será que não poderia ter acontecido antes? Ou algumas ideias que entraram no trabalho com o indiano - cacete, como não havia visto isso?… ou finalmente perceber que, mais uma vez, algumas vezes você terá que seguir sozinho e ninguém te encontrará no meio do caminho… Tudo parece ter demorado mais do que deveria… e me culpo ainda muito por toda essa demora (sim, eu sempre me achei devagar pra processar as coisas, embora não o seja pra agir, uma vez que as entenda). Ainda assim, tento aceitar melhor que, se chego na resolução que agora chego, é fruto de tantos meandros pelos quais caminhei. Sem dúvidas, se escolhi o caminho que sigo de agora em diante, muito se deve ao Japão, cultura tão afeita e confortável com a ambiguidade e dubiedade das coisas, com a maneira vaga como as ideias são distribuídas mundo a fora.
Termos gratidão e sermos gratos pelos percalços que passamos. Termos a esperança de que algumas coisas podem tanto afastar pessoas como uni-las, termos a convicção de que errar é parte integral do processo de acertar (e que os dois são indissociáveis)… viver pra se equilibrar numa corda bamba sem termos medo de cair dela. Saber mudar de rota, ter a humildade de aceitar outros trajetos que são tão certos (ou errados!) quanto os que traçamos pras nossas vidas… ter paciência…
Tokyo parece me receber de braços abertos…. ou me dizer tchau tentando acenar com mais clareza oque esses anos na Ásia significaram… Hoje é dia de tentar ver Hokusai… não muito esperançoso de que conseguirei… interessante olhar de perto alguém que conseguiu traduzir a estética japonesa pro ocidente e se comunicar com tanta gente de maneira a influencia-las (Van Gogh, por exemplo)… algumas linguagens são universais mesmo… matemática, por exemplo. Me lembro dos policiais abrindo minha mala na chegada ao Japão… “seno… cosheno”… todo mundo deslumbrado diante do livro de matemática que trazia na mala, como uma tabula cheia de hieróglifos Maias… quanta coisa mudou nesses anos, quanta coisa continua igual… e quanta coisa continuo ignorando…