"-Oque que você vai fazer no Brasil em Dezembro?"
Ouvi isso do meu chefe esta semana, ao comunicá-lo sobre uma viagem para ver minha família. Na hora, fiquei desacreditado. "-WTF.... será que respondo a uma pergunta tão idiota?", pensei. "-Vou no Brasil pegar concha na praia e comer tapioca, sua anta!".
Me calei, contido: não disse nada.
Fui desenrolando a conversa. Abordei o xis da questão, o workshop idiota da empresa acontecer quase no final do mês de dezembro (oque antes acontecera no começo do mês). Me senti afrontado diante disso: onde já se viu, uma empresa com um monte de estrangeiros, fazer um evento desses no final do mês, ferrando todo mundo que pensa em viajar e ver a família?! Fiquei simplesmente puto, e fui conversar mais puto ainda com ele, disposto a construir uma outra ponte além das que já tento construir no momento; dessa vez uma ponte que me permita não participar dessa palhaçada: será que realmente tenho que ir nesse evento?
"-Claro que tem!", disse meu chefe.
Claro!!!!! Sim!! Justamente!! Faz todo o sentido mesmo: trabalho na empresa, então tenho que ir no evento, mesmo que ele seja totalmente em japonês (num japonês super formal, do qual entendo quase nada), e no qual eu devo falar - melhor, me apresentar- por no máximo 2 minutos, se é pra ser como foi no ano passado (frisando: 2 minutos num evento de 5 horas).
Sem sombra de dúvidas.... faz muito sentido! 😋
Diante dessa conversa absurda na sexta, passei o domingo meio estranho1... logo debaixo do coração parecia haver uma pedra, daquelas que não deixam o rio fluir em paz, sabe? Minha cabeça embebida em raiva, eu imaginando belicosamente como abordaria a questão na segunda de manhã, numa outra reunião. "-Se as coisas não saírem como eu espero eu viro a mesa, 'chutopaudabarraca'", pensei por boa parte da tarde.
Foi interessante, me pegar assim raivoso, chutando pedras e abatendo nuvens a tiros: raramente sinto isso, essa hostilidade por alguém ou algo. Assim que senti isso e não pude me desenredar dessa pedrinha dentro de mim, sabia: "- eu não estou agindo racionalmente..." Foi o momento de parar pra tentar entender melhor oque estava rolando, a não me precipitar, a ver oque está em jogo, a ver como, em uma possível conversa, não me deixarei levar pela raiva em me sentir roubado, mas sim ouvir e falar com tranquilidade, e aceitar oque devo aceitar, sem fazer do chefe, pelo qual não nutro admiração alguma, um indesejável inimigo.
É complexo isso: quando achamos que alguém se põe no nosso caminho por maldade ou por pura falta de consideração, agimos como bicho: voltamos a ser instintivos, protetores de nós mesmos. A sensação é tão desagradável, que hoje saí de casa só para tentar difundir isso no meio, me sentir menos preso e definido só por isso. Enquanto caminhava, me lembrei de que esse sentimento, que mais parece um veneno, já havia me visitado: uma vez, enquanto na pós nos eua, puto que estava com o departamento onde estudava, com os docentes pros quais trabalharia naquele semestre. Sim; havia ali também oque havia notado neste caso: alguém, me roubando de algo. No caso, me roubando do meu tempo com minha família. Incrível como temos uma memória emocional que funciona como músculo: em situações semelhantes, (re)agimos e interpretamos o momento da mesma forma.
Me custou dividir a questão. Me custou olhar pro outro lado. Me custou abrir mão da minha belicosidade, da minha vontade de ir à guerra e fazer meu chefe ouvir tudo aquilo que tenho a dizer e que acharia justo ele engolir goela abaixo... não: entrar em guerra não é a melhor maneira de se resolver um embate.
Meditei um pouco. Amanhã, antes do trabalho, tentarei meditar mais um pouco: logo cedo terei outra reunião para abordar a questão da ida descabida ao workshop desnecessário... desconforto que espero, com calma e sabedoria, poder remover daqui de dentro do meu peito, onde ainda sinto que ele me cutuca.
[Como dizem mesmo no serenity prayer:]
[God, grant me the serenity to accept the things I cannot change,
Courage to change the things I can,And wisdom to know the difference.]
Nenhum comentário:
Postar um comentário