Um dos meus maiores defeitos é ser meio esquecido: me perco nos detalhes de algumas coisas que fiz, ou que um dia ouvi, ou que alguém disse. Me pego no todo, não na granularidade da prosa das pessoas.
Isso é um grande problema, especialmente se as pessoas vêem nisso um descaso da minha parte.
Não, não é.
E por mais que isso já tenha trazido algum problema (em geral, só com ex-namoradas ), este "defeito/bug" me dá algo incrível: a virtude de me encantar novamente com coisas que já tive contato antes.
Well... você talvez vá dizer que eu não precisaria ser tão esquecido pra poder gostar e gostar de novo das coisas... mas enfim, a sensação de redescoberta, do me encantar de novo, parece que vem e me visita mais uma vez quando redescubro algo: seja um teorema, uma idéia, uma música, um beijo, uma sensação que me aflora uma vez mais alguma coisa lá no fundo da alma.
Essa semana tive essa sensação três vezes: a primeira quando ouvi essa música
[Sivuca e Quinteto Uirapuru - Choro de Cordel ]
E que rapidinho me levou a outras, maravilhosas, como esta
[Sivuca e Quinteto Uirapuru - Espreguiçando]
Que delícia poder ouvir isso. Tive um deja vu, sentir de novo aquela mesma sensação que sentia quando ouvia esse álbum enquanto morava no Rio :)
A segunda foi ouvindo a primeira faixa do Siroco, do Paco de Lucia
[La Canada, Paco de Lucia]
A mesmíssima impressão de surpresa que tive ao ouvir à primeira vez, quando ainda morava em Btown, a casa cheia de luz com aquelas janelas enormes, a música transbordando o apartamento inteiro, eu de boca aberta impressionado com a técnica, com a parte percussiva ao fundo que mais pareciam vagalumes piscando, suaves e ao mesmo tempo ali, te lembrando da existência deles, iluminando os detalhes da música como um todo...
E, pela terceira vez, agora à pouco (noite), enquanto voltava pra casa: passou um gambá correndo, atravessando a rua às pressas, e quase o atropelei. O coitado assustado, correu por debaixo de uma cerca. Me lembrou de uma sensação muito curiosa que senti quando algo parecido aconteceu anos atrás, e que eu relatei neste post de 2012: A chairy tale ( ou "sobre gambás e coisas que insistem em não querer ser oque são"). A doçura de ver um bichinho tão inofensivo se esgueirando pelo mundo por sobrevivência... me faz sempre pensar em como, enquanto seres humanos, o nosso progresso implica na destruição do habitat de tantos outros animais. Saio dessas interações como se fosse abençoado pela sorte de vivê-las, e ao mesmo tempo triste por me sentir de mãos atadas: quem me dera as ruas que construímos fosse isoladas o bastante, e não tivessem que ser atravessadas por estes bichos.mente a sensação triste que sempre foi ver
Enfim... é isso por hoje. Melhor eu terminar por aqui porque estou cansado (e por também mal lembrar do motivo que me levou a começar a escrever hoje :P )
"Since I had nowhere permanent to stay, I had no interest whatever in keeping treasures, and since I was empty-handed, I had no fear of being robbed on the way" [Matsuo Bashô , The records of a travel-worn Satchel]
sexta-feira, 21 de fevereiro de 2020
quarta-feira, 19 de fevereiro de 2020
Aguardem, pois no próximo bloco....
É, pessoal. O próximo bloco é mais entrevista.
Na verdade, uma entrevista pra discutir a entrevista anterior.
...e que, agora que continuo a escrever este post, já rolou.
Sabe... nem sobre isso eu ando querendo falar ultimamente. Eu ando cansado e com a cabeça a mil, pensando em como fazer um supercomputador entender oque eu quero que ele faça.
Mas, invariavelmente, ao fim do dia fica aquela musiquinah na minha cabeça...
Melhor eu ir dormir, porque daqui não há de sair mais nada hoje.
Ahh!! Mas antes de ir, deixa eu dar a boa notícia...
.... não, não tem boa notícia não: tava só sacaneando vocês :P
Na verdade, uma entrevista pra discutir a entrevista anterior.
...e que, agora que continuo a escrever este post, já rolou.
Sabe... nem sobre isso eu ando querendo falar ultimamente. Eu ando cansado e com a cabeça a mil, pensando em como fazer um supercomputador entender oque eu quero que ele faça.
Mas, invariavelmente, ao fim do dia fica aquela musiquinah na minha cabeça...
[Beatles, I'm so tired]
Melhor eu ir dormir, porque daqui não há de sair mais nada hoje.
Ahh!! Mas antes de ir, deixa eu dar a boa notícia...
.... não, não tem boa notícia não: tava só sacaneando vocês :P
sábado, 8 de fevereiro de 2020
Una palomita que no vola
[John Williams tocando a belíssima "Que no te quiera más", de V. Emilio Sojo]
Esses dias, numa reunião de trabalho, meu chefe (de uns 50 e poucos anos), pouco habilidos em falar com o público, esperava sem graça no canto pra começar a sessão. De uma maneira quase infantil ele mordia o lábio inferior, expondo dois dentões enormes que tem e que, assimetricamente, são muito maiores que os outros. Interessante, porque achei a imagem fofa já que, mais que tudo, ele me parecia uma criança em primeiro dia de aula. Me dei conta de que ele, em algum dia, havia sido uma criança. Talvez daquele mesmo jeito, dentucinho, num canto, tímido. Sorri diante da imagem, enquanto a reunião já começada me invadia com alertas e mais alertas sobre corona virus.
Curioso, por que lembre essa semana ao ouvir This American Life, num episodio chamado "Pidgeons on a plane", sobre um programa do governo Mexicano para levar maes de imigrantes ilegais a visitarem seus filhos nos EUA. Para aplicar as pessoas devem, por exemplo, ter mais de 60 anos. Pensei muitos nessas pombinhas que não voam. Mais precisamente na minha mãe, que nunca me visitou enquanto vivo fora. Lembro dos primeiros anos no Rio, em que ela me dizia ao telefone "- quando você voltar pra São Paulo", não sei se pra me acalmar (nos meus primeiros dias longe, imerso em angústia) ou por imaginar que, de alguma maneira, a distância era temporária.
O tempo com a minha mãe foi uma grande parte da última visita ao Brasil. As risadas diante daquele mar de tupperwares que os armários dela viraram, as risadas diante das dificuldades, tão felizes e cheias de alegria quanto as risadas diante das vitórias. algo interessante foi vê-la reticente em começar a fazer pilates ("vou deixar pra mudar de casa antes", "vou esperar teu sobrinho crescer um pouco", "vou...") ficava obstruindo toda e qualquer iniciativa minha que, no fim das contas, me ficou óbvio: minha mãe estava com medo de ir sozinha.
Me prontifiquei a ir junto, a entrar junto, a perguntar junto. "Não posso entrar contigo, mas te espero lá fora". E assim o fiz, imaginando que um dia ela havia feito o mesmo por mim. Como uma lembrança, vendo minha mãe me esperando na saída da escola, ou de outra em que abro minha lancheira pra comer meu lanche em casa depois da aula1, pareço fechar um ciclo em que os papéis se invertem: eu levo minha mãe pra fazer as coisas que ela, pequenina, precisa de um empurrãozinho pra começar sozinha.
De certa forma, essa sensação de "completar de um ciclo" foi um pouco do que senti durante minha última palestra (saidera!) nos EUA, diante de antigos professores que tive.... estranho como duas coisas tão díspares podem dar origem a sensações tão similares, não? Vai ver sou eu... vai ver meu olhar anda meio biased quanto a este tópico.
[A se descobrir então: qual ciclo estou terminando?]
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1 Nos meus primeiros anos de escola, estranhamente, eu levava a lancheira cheia pra trazê-la de volta cheia, e então comer em casa. Dizia, após estender uma toalhinha bordada com meu nome, "-só como na casa da tia Lina", e me sentava no chão de casa, assistindo desenhos e comendo bisnaguinhas.↩
Direto da Terra do Sol Nascente # 81: "yeap, I`m here...mas morrendo de saudades"
Finalmente, de volta em casa. Já tem uns poucos dias.
A entrevista com os britânicos, os emails com pedidos urgentes e sem sentido, o supercomputador que não super-computa-porra-nenhuma (ainda!), a sentença que não quer soar da maneira que eu gostaria, o teorema que não sabe se é teorema (ainda!), as dúvidas e auto-flagelações que assombram qualquer entrevistado em busca de emprego, o pouquinho de sol que filtra pela minha janela lacrada por filme plástico - que altera sua natureza de janela (já que ela não pode ser aberta) e vira um quadro do mundo lá fora, a sombra na parede de dois pedaços de pano preso na sacada e que, no pouco sol, parecem braços de orangotango fazendo movimentos os mais variados possíveis, se alongando
stretch.... STRETCH! S--T--R--E--T--C--H!
Voltei. Voltamos.
Voltemos: isso, estou aqui: digredindo, tentando, tentando aprender com os tropeços, tentando animar e finalizar coisas (uminha, finalizada! Faltam outras duas)
Meus deus, como eu sinto falta da América!
Hoje, vendo oque ia pro lixo na pilha de recicláveis, me peguei com alguns postais não enviados de Paraty, nessa última viagem. As boas lembranças de ficar rindo de tudo, de ficar sacaneando o liguajar do pessoal da cachaçarias, das quais saíamos inventando pingas imaginárias, feitas em alambiques com qualidades exóticas. Ou as viagems de barco, que acabavam num livro imaginário sobre praias que não existem (de certa maneira, um pouco na linha do que o Italo Calvino faz no "Cidades invisíveis", do qual eu falei neste post de 2018). A lembrança da família, do sobrinho tirando sarro da minha mãe, a alegria dessa diante do neto, os amigos brasileiros, os amigos americanos, os quilinhos a mais (tô trabalhando nisso!), o carinho dos ex-professores e, sem lugar menor no pódium de alegrias, um monte de papaya, manga, suco de graviola...
Deixamos o ocidente pra trás, mas este nos persegue, na mala, nos sonhos, nos ideais de sossego quando a mente viaja e vai láááá longe.
E caramba: oque era pra ser só um textinho, um singelo post de poucas palavras, se desdobrou em uma ode cheia de saudades ao lado de lá. 💜💜😄😄
quinta-feira, 30 de janeiro de 2020
Direto da Terra do Sol Nascente # 80: "você voltou?"
Sim, eu voltei. Agora, pra que? ...é um enigma.
No aeroporto já sou inundado por emails que me pedem de tudo: escreva isso, me ajude com aquilo, precisamos terminar o artigo, você se lembra daquele beta na equação, qual é sua cor favorita, você gosta de pôneis.
A vida nipônica, como uma erva daninha, parece querer se apoderar de tudo que tenho, não deixando espaço pra nenhum resquício de férias ou mundo ocidental que trouxe na mala.
Rapidinho, já começo a sentir o sossego correndo pelos meus dedos: um email que respondo, um latex que escrevo, uma vaga de trabalho que me parece interessante e pra qual penso em aplicar, entrevistas, contas de luz e de água.
Férias, ó férias: você me dá saudades
Aclimatizo e Tokyo na casa de amigos americanos. Como uma zona de descompressão, sinto-me voltando aos poucos pra vida na terra do sol nascente. Hoje, finalmente, volto pra casa: depois de mais ou menos 42 dias fora, penso oque será reatar laços com minha casa, com meu trabalho, com minha vida, com kinoko-san e gardênia.
Respira fundo.... você dá conta.
No olho do furacão (visita à antiga casa) - final
Talvez a coisa mais difícil nessa viagem à antiga casa no norte, o sentimento mais estranho que senti, foi conversar com a esposa de um amigo e sentir a estranheza na prosa dela. Como um barco que perde a âncora e passa a flutuar cada vez mais distante do seu porto, a loucura deve causar um distanciamento entre pessoas inimaginável: é perder alguém, tendo esta pessoa ainda ao seu lado.
Curioso eu dizer isso, na verdade.... isso por que tenho uma amiga de infância (mais amiga da minha irmã) cuja mãe bem cedo começou a sofrer de esquizofrenia: um belo dia ela saiu e não sabia como voltar pra casa. Depois os incidentes foram se acentuando, e em um momento ela deixou de ser ela mesma.
Injusto talvez dizer isso... porque a pessoa é a mesma ainda, de alguma maneira, mas corpo e mente se desprendem, e nos resta só essa carcaça da qual somos feitos.
Não sei por que isso me tocou tanto. Acho que a compaixão pela dor que meu amigo, se conseguiu perceber o problema (acredito que sim), deve sentir. Perder alguém pra um inimigo maior, que dorme com a esposa o tempo todo, acorda com ela o tempo todo, é seu maior confidente e é, no fim das contas, uma parte indivisível do que a pessoa que ele ama se tornou. Me tocou muito a fragilidade daquela relação, madura e com filhos, com tantas estórias, festas entre amigos, e viagens. Me tocou relembrar das minhas relações em que senti o barco desancorado visto da praia, sem chance de ser resgatado senão com muito esforço, ou mesmo sob o risco de se afogar no mar bravio que tudo leva, que tudo que ali flutua um dia clama.
domingo, 26 de janeiro de 2020
No olho do furacão (visita à antiga casa) - parte 5
Sabe oque talvez seja o mais estranho de estar aqui, de volta a um lugar que foi tão importante na minha formação como adulto? Sentir que faço e não faço parte disso: ando pelas festas e sinto o quão legais são, suas teses, seus intentos, interagir, falar mais mil vezes sobre oque trabalho - e que tem pouquíssima relevância pra maioria delas, e no fundo, lá no fundo, achar tudo meio sem graça.
Uma coisa que é bem comum a mim é precisar de um tempo de repouso, um tempo de silêncio. Ohhh man.... I need a break! Sim, esse sou eu. Preciso de um pouco disso, de não terem que me forçar a interagir, a acharem algo sobre uma peça, a sentir algo pelo condutor da ópera e a maneira como ele rege, a pensar à respeito de qualquer coisa.
Das duas uma: ou eu sou um chato, ou eu estou cansado.
Sabe... acho que um pouco dos dois: esses dias têm sido bem intensos. Acima de tudo, sinto essa mistura de medos que parecem me percorre por debaixo da pele, em procurar aquele emprego que eu procurava ano passado e ainda não apareceu, em terminar meu artigo (cuja idéia foi bem recebida por aqui, felizmente). Me pergunto: pra que que eu vim? Talvez pra poder olhar pra tudo desde o começo, e poder tentar traçar o começo dessa jornada: ter ido ao Rio, depois pros EUA, e depois pra mini-apple, depois terra do sol nascente.... foi a mesma pessoa que percorreu todo esse caminho? Mesmo?
Reencontrei uma amiga de escalada, que não põe uma gota de álcool na boca por conta de drogas (das quais largou há anos). Me conta sobre o porque usava, por conta de uma visão muito negativa sobre si mesma, muita pressão pra sempre ser "melhor" de alguma maneira.
A ouço.
Ela me ouve.
E me diz: "- you have not changed much in that sense... you still have a very distorted view of yourself."
E saio da conversa de maneira não-euclidiana, refletindo sobre essa palavra/frase que tantas vezes ouvi - de amigos, de terapeutas - em que as linhas paralelas do meu pensamento parecem se encontrar mil vezes, se emaranhar, e se distorcer .... sendo, desde o começo, apenas paralelas.
Vir ver não ajudou de maneira alguma nisso. Ter vindo talvez não tenha tido um propósito 100% claro... Mas quem disso que era pra ter algum propósito? Quem disse que era pra ajudar?
Uma coisa que é bem comum a mim é precisar de um tempo de repouso, um tempo de silêncio. Ohhh man.... I need a break! Sim, esse sou eu. Preciso de um pouco disso, de não terem que me forçar a interagir, a acharem algo sobre uma peça, a sentir algo pelo condutor da ópera e a maneira como ele rege, a pensar à respeito de qualquer coisa.
Das duas uma: ou eu sou um chato, ou eu estou cansado.
Sabe... acho que um pouco dos dois: esses dias têm sido bem intensos. Acima de tudo, sinto essa mistura de medos que parecem me percorre por debaixo da pele, em procurar aquele emprego que eu procurava ano passado e ainda não apareceu, em terminar meu artigo (cuja idéia foi bem recebida por aqui, felizmente). Me pergunto: pra que que eu vim? Talvez pra poder olhar pra tudo desde o começo, e poder tentar traçar o começo dessa jornada: ter ido ao Rio, depois pros EUA, e depois pra mini-apple, depois terra do sol nascente.... foi a mesma pessoa que percorreu todo esse caminho? Mesmo?
Reencontrei uma amiga de escalada, que não põe uma gota de álcool na boca por conta de drogas (das quais largou há anos). Me conta sobre o porque usava, por conta de uma visão muito negativa sobre si mesma, muita pressão pra sempre ser "melhor" de alguma maneira.
A ouço.
Ela me ouve.
E me diz: "- you have not changed much in that sense... you still have a very distorted view of yourself."
E saio da conversa de maneira não-euclidiana, refletindo sobre essa palavra/frase que tantas vezes ouvi - de amigos, de terapeutas - em que as linhas paralelas do meu pensamento parecem se encontrar mil vezes, se emaranhar, e se distorcer .... sendo, desde o começo, apenas paralelas.
Vir ver não ajudou de maneira alguma nisso. Ter vindo talvez não tenha tido um propósito 100% claro... Mas quem disso que era pra ter algum propósito? Quem disse que era pra ajudar?
sábado, 25 de janeiro de 2020
No olho do furacão (visita à antiga casa) - parte 4
No fim do dia eu estou simplesmente exausto... caindo aos pedaços
Esssa semana foi cheia de vírgulas, de reuniões, de voltar a uma vida que eu tinha, a problemas que eu gostava (ou achava que gostava) de resolver... terminar coisas, crescer e dizer pros que me "criaram" (ao menos academicamente) que estou de partida.
Au revoir! Tchau! Adios! Bye!
É... por mais que insistam em me convencer em ficar um pouco lá-um pouco cá, um pé dentro-outro fora, essa saída é definitiva: there's no way back. I'm leaving you, babe.
Uma curiosa visita, onde cumpri, "completei" (na verdade eu completei sem completar ainda 😬) um ciclo, em que me me permiti - e me abri- a mudanças, e volto para o "mesmo" lugar, que por sua vez é outro também.
Outra cidade sendo a mesma: ando por ela, vejo a riqueza, a mudança, ouço sobre os problemas, suas misérias, seus white supremacists que parecem brotar em todos os cantos -na mídia, na feira de produtores locais, na cidade... e penso no que cresceu, e no que parece ter se corroído e deteriorado.
Esssa semana foi cheia de vírgulas, de reuniões, de voltar a uma vida que eu tinha, a problemas que eu gostava (ou achava que gostava) de resolver... terminar coisas, crescer e dizer pros que me "criaram" (ao menos academicamente) que estou de partida.
Au revoir! Tchau! Adios! Bye!
É... por mais que insistam em me convencer em ficar um pouco lá-um pouco cá, um pé dentro-outro fora, essa saída é definitiva: there's no way back. I'm leaving you, babe.
Uma curiosa visita, onde cumpri, "completei" (na verdade eu completei sem completar ainda 😬) um ciclo, em que me me permiti - e me abri- a mudanças, e volto para o "mesmo" lugar, que por sua vez é outro também.
Outra cidade sendo a mesma: ando por ela, vejo a riqueza, a mudança, ouço sobre os problemas, suas misérias, seus white supremacists que parecem brotar em todos os cantos -na mídia, na feira de produtores locais, na cidade... e penso no que cresceu, e no que parece ter se corroído e deteriorado.
segunda-feira, 20 de janeiro de 2020
No olho do furacão (visita à antiga casa) - parte 3
Hoje no café da manhã, mesas e mais mesas de pessoas caucasianas com 4, 5, 6, 7 filhos e famílias, sentadas todas comendo suas pancake, bacon, fruit-salad-with-no-fruit-taste-at-all.
E pra variar, isso me lembra algo, the great, ela se não outra: Ella
Um homem da mesa ao lado reconhece a conversa minha e de uma amiga, em português. Se apresenta, diz que fazia capoeira, e que adora português:
" - smoother and more mellow than spanish...". Promete-nos que da próxima ira nos dizer oi e umas palavras em português.
Penso no que era viver aqui, no que era viver tão preso a uma coisa, a um título, como foi viver por 5 anos nessa terra.
5 fuckin' longos anos!
Eternidade!
Years!
Yeah... it was hard!
Minha amiga fala do relacionamento, de como é ser acolhida por uma outra família que não a sua em terra tão distante. Fala das dúvidas, do break-up que antecedeu a vinda à terra do tio sam. Penso em mim, no mei trajeto, no eu barquinho que aqui chegou desconhecendo tudo, ignorante quanto a tanta "selvageria" que regia o país mais rico do mundo:
A riqueza
O conforto
A sujeira debaixo do tapete
Não consigo vir, ver e viver sem me lembrar dos dias aqui. Penso no Brasil:
A riqueza
As frutas
A sujeira debaixo do tapete
E penso que é tudo igual, fruta de plástico ou não, conforto ou não, 8% of your taxes going to the military ou não, 8% of your taxes going to bribes and politicians in Brasilia ou não... logo me vendo preso no grande rabo-preso da lógica de uma pessoa que não sai do lugar, que descobre que os predicados tinham um rabo-preso com a conclusão, que por sua vez dependiam do predicado...que por sua vez....
Nessas horas eu paro, por que me é claro que estou sentindo falta de algo: de alguém, de alguma coisa que me preenche
-Alguém viu minha rotina? A perdi no caminho, há mais de um mês não volto pra casa... ela é uma menina magrinha e atarracada, que não gosta de luxos, e tem um cachorro e um aquário com um polvo...
Penso na minha rotina, perdida no aeroporto, chorando num cantinho até ser encontrada por um adulto responsável que a leve de volta para os seus.
Esse adulto: eu, que não volto pra casa nunca
Casa... quero voltar pra minha.
Pra ser sincero, quero encontrar casa.... e ter vindo visitar a antiga só me fez ver que há anos, e anos, e anos, eu não tenho uma própriamente dita
E pra variar, isso me lembra algo, the great, ela se não outra: Ella
" a chair is not a chair....
A room is a still a room, even when there's nothin' there but gloomBut a room is not a house and a house is not a home
When the two of us are far apart
And one of us has a broken heart"
When the two of us are far apart
And one of us has a broken heart"
[A house is not a home, Ella Fitzgerald]
Na verdade pensei nisso tudono café da manhã hoje cedo, enquanto ouvia minha amiga e, no fundo, pensava em mim, com ais ou menos a mesma idade vivendo aquelas coisas todas, e a acalmava, cheia de dúvidas de tudotodotipo.
Isso tudo pra dizer que.... andei em círculos, e cheguei no café da manhã de novo.
sexta-feira, 17 de janeiro de 2020
No olho do furacão (visita à antiga casa) - parte 2
Sabe oque é engraçado de visitar os eua e vir numa conferência? Me sentir meio peixe fora d'água. Ok, ok, vim logo num evento que nada tem a ver com minha área, apesar de uma técnica aqui e ali ser aproveitável. Mas no todo é isso mesmo: mesmo no que faço sou um pouco "outsider".
Curioso isso, porque na vida me sinto um estrangeiro. No meu país me sinto um estrangeiro. No meu trabalho me sinto meio isolado.E quando vou em busca de um evento onde me sinto mais em casa, me sinto perdido.
Que coisa, não?
É curioso isso, pois recentemente (digamos, há uns meses) eu tive um momento meio catártico, em que virei a mesa, e disse pra mim mesmo que não trabalharia mais com ninguém que não sentisse remar o barco na mesma direção ou com o mesmo entusiasmo.
That's it, babe: resolução de 2020 antes mesmo de 2020 pousar na Terra.
Outra coisa interessante dessa vida aqui é sentir essa vida "fake plastic tree" norte americana: onde a manga não tem gosto de manga, o mamão não tem gosto de mamão, as árvores foram desenhadas no autocad, e as focas domesticadas que visitam a praia não são mais animais e sim animais hooked-on-junk-food.
A vida aqui tem um gosto estranho....
...um gosto estranho de vida estranha. De comida estranha... de gente estranha....
Recentemente, após livro do Kahnelman, li sobre um experimento que diz que pessoas que são lembradas sobre dinheiro (por imagens, ou sugestionadas de alguma outra forma a lembrar sobre dinheiro) exibem traços mais evidentes de egoísmo. E, como era de se imaginar, todo o tempo, toda imagem, é dinheiro:
- teu acidente de uber é dinheiro pra um lawyer que é especialista em pegar dinheiro de gente que sofre acidente
- teu parking está comendo teus quarters enquanto você respira
- o donut da esquina, é mais barato e vem mais
- a música alta no restaurante te dá uma sensação de academia de ginástica, em que a vida segue no 220V, assim como teu trabalho, teus amores, teu salário, teus amigos, teu coração, e tudo tudo mais
Não sei se onde morava era muito diferente disso... me lembro de lá de uma maneira diferente, não como L.A... mas posso muito bem estar enganado.
Será que eu vivia numa bolha, fake-bolha, fake-food, fake-everything, e nunca percebera?
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