sexta-feira, 5 de julho de 2019

Diagnóstico: descolamento do mundo

Ano passado, durante as eleições brasileiras, conversava com um amigo de infância pelo telefone (ele em São Paulo, eu no Japão), quando lhe disse sobre minhas ressalvas quanto ao então candidato a presidente Bolsonaro. Enumerei os mil e um motivos contra que tenho, ao que meu amigo, investidor na bolsa (um dos assunto da conversa daquele dia), me retruca com um 

"-Mas vejamos oque o mercado quer."

Eu não me aguentei na hora e o questionei:

"- Como assim... o mercado não vota! O mercado não tem nada a dizer  sobre oque as pessoas precisam pra elas, pra maioria, talvez." 

Em princípio, achei que a conversa se tratava do embate entre alguém  (ele) que acredita no neo-liberalismo, no capital agindo como grande bem-feitor na vida das pessoas, e minha crença, algo meio disforme, mas que é totalmente oposta a tudo oque acabei de descrever. Mas depois desse breve choque, mudamos de assunto e fomos os dois falar sobre outra coisa.

Passaram-se alguns meses e eu, preocupado com o meu futuro, resolvi investir na bolsa um pequeno montante que me sobrou (pela primeira vez na vida). Um belo dia, antes de ir pra cama, olho minhas ações que, estranhamente, subiram mais do que o usual. 

"-Estranho... deve ter algo acontecendo no Brasil  neste momento", pensei. 

E, de fato, havia: greve geral contra a reforma da previdência, greve, protestos nas ruas. Na hora lembrei da conversa com o meu amigo, e vi que nela havia algo que não havia percebido: o egoísmo. Há uma clara dicotomia entre os interesses pessoais e os interesses coletivos, algo que fica evidente quando se há um "ganho" por trás. Talvez evidente não seja bem a palavra, mas exacerbado. É só você imaginar a hipótese: o mundo ao seu redor caindo aos pedaços e você na bonanza, fazendo dinheiro. Você vai se preocupar? Pense na associação causal que as pessoas tiram disso: se o mundo numa merda me faz ganhar dinheiro, então...

Há um enorme erro nisso, que vai na raíz do que o ser humano é. Ao nos desconectarmos uns dos outros o, e até sermos recompensados por isso, o mundo que criamos é esse: de pessoas que só se preocupam com elas mesmas, com os "ganhos" delas. E o ganho mais imediato e óbvio que as pessoas vêem em geral se chama... dinheiro, mas certamente pode se traduzir em outras coisas, como reconhecimento, ou prestígio. 


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