sexta-feira, 13 de agosto de 2021

Pessoa-iceberg

Pouca gente repara nisso, mas há algo muito comum nas pessoas que se expõe ou resolvem criar algo: oque elas mostram em geral é somente uma fração diminuta do que elas realmente criaram. E nem falo sobre o fato do trabalho ter sido reduzido, polido, enxugado a um produto final. Falo, isso sim, de só vermos aquilo que o autor considera digno (ou com algum valor) para chegar à luz do dia.


Acho que todos que criam tem isso, de uma maneira ou outra. Há algum tempo soube que o Prince tem um arquivo gigantesco de coisas que gravou em seu estúdio, mas que nunca considerou para divulgação (a família que está lucrando com essa estória). Adiciona-se a isso outros nomes: Jimi Hendrix, J.D. Salinger etc. Tudo oque essas pessoas publicaram em vida é uma ponta de iceberg diante daquilo que veio depois. É claro, há muita discussão sobre a legitimidade de alguém sair publicando coisas que estes consideravam indignas de serem vistas/ouvidas/lidas. Mas isso é outra discussão. 


Comecei a pensar nesta questão ao reparar em quanta coisa eu tenho que nunca achei que deveria ser finalizada, ou mesmo trabalhada a um produto final. Este blog, por exemplo: possui 694 posts publicados, e um total de 975 escritos, oque dá uns quase 30% de coisas que provavelmente nunca vou postar - ou por falta de vontade de terminá-las, ou por achar que não são boas, ou simplesmente por não ter mais tesão nelas. No que diz respeito a trabalho, a taxa fica por aí também: uns 30-40% em artigos esquecidos que nunca fui atrás de finalizar, de programas que não fui atrás de debugar, de pingos nos "i's" que deixei de dar.


Existe um equilíbrio enorme neste caso que tem dois extremos: uma pessoa que divulgue tudo oque faz (talvez este tipo de "artista" já exista; o Instagram está cheio deles haha) e, num outro extremo, um artista tão exigente consigo mesmo que não divulga nada.


Mas vamos fugir de extremos por agora e voltar ao mundo dos humanos "normais", que vivem num meio termo entre estes dois casos. Fico refletindo sobre as taxas de cada pessoa. Será que as pessoas têm isso? Será que existe um "quociente de aproveitamento/divulgação" de cada um? Talvez, como disse anteriormente, a questão nem seja o quanto se aproveita, porque ao sermos exigentes com oque deixamos "escapar" pro mundo damos sinal de senso crítico, de respeito por nós mesmos (e pelos outros), além de curarmos aquilo que criamos. 


Ao que parece, gerirmos nossas vidas como uma ponta iceberguiana que os outros vêem e uma parte "obscura", longe de olhos alheios ("longe de olhos alheios".... vou virar cantor de lambada depois dessa :) que pode até parecer inútil, ou lixo, mas talvez sirva como uma base de sustentação a tudo aquilo que chega ao crivo do mundo.


Me estendo então, e penso num outro iceberg - visível/invisível - que fica entre oque dizemos ou não. Claro, se não digo nada do que penso eu viro uma pedra. Por outro lado, se disser tudo oque penso - sem freios  ou amarras - posso acabar em sérios problemas (na verdade este último caso se trata de uma doença chamada "sindrome de Tourette"). 


[Mas por que comecei a falar disso tudo mesmo?] 

[Bom, ao menos dessa vez vou dar um destino diferente a este post, tirando-o do submundo dos posts que nem ouso publicar....]

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