Acordo pensando se vou ter oque comer nesse dia. Olho pra minha humilde despensa de casa temporária e me aflijo: feriado lá fora e escassez aqui dentro. Direitos trabalhistas fecham supermercados em dia de feriado e imigrante morre de fome - deu na manchete do jornal. A beleza e o romantismo de se morar fora. Mas quem vê isso?! Vale mais a pena o sensacionalismo. Penso em comida e abro a geladeira. A cenoura da segunda prateleira conversa com a família de abobrinhas que mora na prateleira de baixo. Riem. Ao me verem, cessam a conversa e se fingem de mortas. Mortas e murchas mas ainda comida: o feriado não há de lhes poupar da panela.
Penso no feriado e nos malditos direitos trabalhistas. Homens que querem e têm o direito de ficar com suas famílias enquanto outros viajam pra longe das suas e dos seus e morrem de fome ao atravessar o deserto. Rafaello-exupery cai com seu avião no Saara alemão e hoje até água vai ter q ser da torneira. Pondero... talvez algo escapou ao meu olhar escrutinador faminto: um pedaço de queijo que camaleonicamente imitou o fundo da geladeira, um tomate desentendido, um pote de iogurte fujao...
Não: estou fadado à fome. Penso em que lei basear minha defesa caso me prendam: "brasileiro preso na Alemanha por saquear o supermercado". Mais vale o sensacionalismo que minha dor. "Brasileiros passam fome na Europa", tema em pauta na ONU e seus fóruns. Direitos trabalhistas... onde já se viu... se a função do trabalho é engrandecer e alimentar o homem, aonde mora o erro já que tantos, como este que lhes escreve, perecem e passam fome?! Olho o céu lá fora, cinza... devestar cinza de fome. A expressão não existente aparece em minha cabeça como um pop up mental que me gera risos de ansiedade e medo. Vamos lá, abobrinhas e cenoura... hoje vcs ganharam o dia.
Sigo reticente para a cozinha, escalando os últimos metros desse everest sem tubo de oxigênio. Força se me faltarem letras e palavras... animo se me sobrar fome.
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