sexta-feira, 16 de fevereiro de 2018

Direto da Terra do Sol Nascente, #22: "Docinho"

Chego do almoço. Sento na minha mesa.

Passam alguns minutos, abro minha caixa de emails.

Um email do meu chefe:

"I need to talk to you. It is very important. Come to my office asap."

Asap... as soon as possible... Parece um americano, sem tempo a perder, pra nada.

Mas é um japonês.

Percorro o corredor branco sob um clima sombrio. Ouço meus passos ressoando "nhec-nhec"

Bato na porta. "Yesss....?"

Entro. It's me.

O sol bate la fora, mas as persianas estao todas fechadas. Faz frio. Meu chefe não sorri.

Em geral ele não sorri.

Ele me olha com os olhos semi-cerrados, mais japoneses que antes. Perscrutadores. Invasivos.

Olho pro seu cabelo acaju.

"Ele pinta o cabelo, eu sei", digo a mim mesmo.

Me pergunto oque a atendente da loja pensa quando o ve comprando a tinta pra cabelo.

"-5 milhões de yens!... ahhh brincadeira!"

... e ele não ri da piada japonesa.

"-Voce sabe por que te chamei aqui?"

"-Não muito bem... mas suspeito..."

"-Suspeita?!"

[Ele me interrompe]

"-Foi por causa do Togonama, não? Ele nao vai com a minha cara!"

"-Nao? Vai dizer que voce nao fez oque ele tem dito por aí?"

"E oque ele tem dito?" 

"- Que vc roubou o bolo anamaria cremoso ultra recheado da tua colega vietnamita!"

Ele vocifera, aos berros. 

Eu olho pro chão.

E comeco a solucar, chorando

"-Mas é por que eu estava com tanta saudade de provar daquele doce...."

Meu rosto, salgado em lágrimas.

sábado, 10 de fevereiro de 2018

"As constant as a northern star" [Direto da Terra do Sol Nascente, #21: "a impossível arte de ser não sendo (parte IV)"]



Desapego é uma palavra interessante... e que diz respeito a tantas coisas... nossa necessidade de crescer, de nos afugentarmos da dor e/ou de nós mesmos, de tudo aquilo que não nos deixa sermos oque buscamos ser. A profunda necessidade de partir. E isso machuca, nos machuca, machuca os outros. E dói, acima de tudo, vermos que outros também se afastam de nós para poderem crescer, para se alinharem diante de suas escolhas, diante das direções  em que buscam remar.

Partir e deixa que os outros partam.
Crescer e deixar que os outros cresçam.
Deixar de amar e aceitar que os outros deixam de nos amar também. 


Oh, I am a lonely painter

I live in a box of paints



I'm frightened by the devil

And I'm drawn to those ones that ain't afraid


[Joni Mitchell - A case of you]