Todas as manhãs de natal são parecidas. Isso deve ser um teorema, ou uma lei do mundo. Você acorda e parece que sempre alguém acordou antes e já está na cozinha, peparando o café pra todo mundo: mãe, pai, tio, tia, primo, cachorro, irmãos no geral.... o que muda é um detalhe, o natal continua o mesmo e a ceia do dia 24 é sempre aquela, do ano anterior
Pra variar, aquela sua tia carola, que na verdade nem sua tia é, é uma tia da tua mãe que quase automáticamente é sua tia, quer deixar a tv ligada pra ficar vendo a missa do galo, aquela que é o pesadelo de todas as pessoas que não gostam de missa, por que além de ser looooooooonga pra caraleo, parece acontecer mais devagar ainda, por que é em câmera lenta. Aí o papa dá feliz natal em javanês, português, polonês... aí vc sai da sala, pq sua tia (a sua tia que não é sua tia ) fica emocionada e, pela milionésima vez, ela começa a lembrar com a sua outra dia (agora uma tia de verdade) dos papas anteriores... vc se esquiva da conversa e vai pra cozinha.
Já está bem tarde e a comida, pra variar, ainda não está pronta. Vc entra na cozinha e pergunta
-Já pode comer?
E se as pessoas estão meio bravas umas com as outras, por que seu tio gosta de muito alho no arroz e sua irmã odeia, e sua mãe gosta de cozinhar do jeito dela e ignora a todos, alguém ou todos vão dizer rispidamente
-Não!!! Esperaeficalongedacozinha!!!
Aí você não tem desculpa... você só pode fazer o que uma pessoa sensata e que luta pelo que quer (sim, você é uma dessas pessoas) pode fazer nesse momento. Vc diz bem alto
- Mas eu estou com fome!!
Aí sua tia te abraça (sua outra tia) e fala pra você ficar calmo e esperar um pouquinho, que já já a ceia está pronta.
Vc volta pra quaquer lugar da casa onde não tenha tv, ou onde vc não consegue escutar o barulho da tv alta, com alguém narrando uma missa (incrívelmente nonsense isso!!! A humanidade é um ser monstruoso, sem pé nem cabeça ) e tenta pensar no verdadeiro espírit,o do natal. Sei lá, vc cresceu assim e nunca se deu conta de que o que vc realmente mais esperava eram os presentes e a comida... no geral, toda a parte religiosa não faz muito sentido pra ti.... vc só vai, come bem como vc nunc acomeu desde o útlimo natal, e dorme, pensando que pelo menos o reveillon vai ser divertido e mais agitado... mas o espírito do natal vc não sabe onde foi parar. Vc então, num ato de extremada coragem e bravura, ousa pensar que o espírito de natal é tudo aquilo..é tudo que há de prosaico e simples, mas que quando junta torna aquele momento importante... o espírito de natal está em tudo! Está ali, na estante de livros na sua frente, na poeira no canto da sala, debaixo da almofada do sofá em que vc está sentado. Então, para corroborar com sua tese, vc pega a almofada de maneira sem graça - para que ninguém perceba - levanta-a, e olha embaixo:
Não há nada....espere! Há sim: um brinquedo.. Talvez de alguma das crianças que está presente na ceia.
Vc levanta e pergunta bem alto
- Quem perdeu um boneco feio, azul, que está de chapéu!!!???
E seu priminho sai gritando bem alto que é dele, e vem correndo em sua direção... normalmente, junto com o seu cachorro - que não sabe se corre atrás do seu primo ou se abocanha o boneco, por pensar que é um osso pra ele - enquanto sua mãe fala pausadamente:
- Depois vc vê isso... vem comer que a ceia tá na mesa e já estão todos comendo.
"Since I had nowhere permanent to stay, I had no interest whatever in keeping treasures, and since I was empty-handed, I had no fear of being robbed on the way" [Matsuo Bashô , The records of a travel-worn Satchel]
sábado, 25 de dezembro de 2010
quarta-feira, 15 de dezembro de 2010
Peanut butter + Tarantino
[O senhor F entra no supermercado]
[Ele parece estressado e doente]
[Segue em direção ao caixa mais próximo à entrada automática]
[Pergunta à atendente, de maneira como se continuasse uma conversa que, de fato, nunca existiu]
- Vocês têm manteiga de amendoim?
- Como?
- ...Ma.. Manteiga de amendoim
- Acho que não.
[Ela faz uma breve pausa para olhar para as unhas]
[Quando se dá conta disso ela esta um pouco sem graça]
..... a ...acho que aqui não se vende dessas coisas
F, transtornado, coça a cabeça e, sequencialmente, põe a mão no bolso.
[A mulher se assusta][O homem parece um homicida]
[Daqueles de grandes tragédias que são relatadas em programas vespertinos. Das que nós só ouvimos falar quando chegamos em casa à noite, depois do trabalho]
O senhor F se desloca para o fundo da loja, entre as prateleiras. As atendentes lançam um olhar entre elas. Uma chega até a se inclinar no seu banco para ver aonde tal sujeito iria.
Ele some entre as prateleiras, voltando depois de duas horas, com uma embalagem de água sanitária.
O senhor F paga com um dinheiro todo amassado, tirado do bolso de dentro da jaqueta. Ele sai da loja e, ainda na calçada, abre a água sanitária e encosta o bico da embalagem na boca.
[Ele pára]
[De repente]
De repente ele pára! Todos os que viam a cena estavam chocados. O homem não se dá conta disso. Entra na loja novamente e corre em direção ao primeiro funcionário que vê. Ofegante, pergunta:
-Vocês têm manteiga de amendoim?
Assinar:
Postagens (Atom)